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Em péssima companhia
O TERCEIRO-MUNDISMO é um
veio que a gestão do presidente Lula explora à farta
na política externa. Faz parte da
ração com que o governo alimenta os grupos ideológicos na intenção de compensar, no plano
simbólico, a agenda conservadora adotada em outros campos.
Com freqüência, essa estratégia leva o Brasil a abraçar posições ora anacrônicas, ora inadequadas ao interesse nacional, ora
até moralmente injustificáveis.
Brasília acaba de emprestar seu
aval ao pior genocídio em curso
no planeta: o massacre de Darfur, que já matou mais de 200 mil
pessoas e deixou 2,5 milhões de
refugiados no Sudão.
Na terça-feira, no Conselho de
Direitos Humanos da ONU, o
Itamaraty se absteve de votar
uma resolução que exigiria do
Sudão o julgamento dos responsáveis pelo morticínio. A resolução acabou derrotada por 22 a 20
e 4 abstenções. Diplomatas sudaneses mal continham a satisfação diante do voto brasileiro.
A carnificina em Darfur começou em 2003, quando a população local rebelou-se contra o governo central, o qual acusava de
discriminar os grupos não-árabes. Cartum passou então a armar a milícia Janjaweed, de sudaneses arabizados, que deu início a uma "limpeza" étnica.
O resultado da votação no
Conselho diz tudo sobre a posição brasileira: o Itamaraty abandonou a companhia de países como Canadá, Finlândia, Holanda
e Suíça -que condenaram o Sudão- para juntar-se a algumas
das piores ditaduras do planeta.
Votaram a favor de Cartum ou
abstiveram-se nações como Arábia Saudita, Argélia, China, Cuba, Paquistão, Rússia e Zâmbia.
Vale ressaltar que as expectativas em torno da reforma do setor
de direitos humanos da ONU se
frustraram. O novo Conselho é
tão ruim quanto sua antecessora,
a desacreditada Comissão de Direitos Humanos. A aliança espúria entre ditaduras e países sem
fibra moral faz com que a única
nação sempre condenada pelo
Conselho seja Israel.
A arte da diplomacia consiste
em equilibrar-se, com alguma
coerência, entre pragmatismo e
apego a princípios morais. Quando o Itamaraty sacrifica o segundo em favor do primeiro numa
questão tão grave como a de Darfur, lança o Brasil na incômoda
posição de país que se cala diante
de um genocídio.
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