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POSSÍVEL MUDANÇA NO BC
Os acontecimentos recentes envolvendo o Banco Central e bancos
privados e a forma como foi conduzida a transição do regime de âncora
cambial para o de flutuação sugerem
uma zona de sombra em torno e
mesmo dentro da instituição que deve ser a guardiã da moeda.
As autoridades continuam devendo
esclarecimentos à sociedade, sobretudo no que se refere aos critérios
que ampararam a decisão de socorrer
os bancos Marka e Fonte-Cindam,
vendendo-lhes dólares subsidiados
sem que, em tese, suas dificuldades
representassem riscos sistêmicos
para o setor financeiro.
Não se trata, é preciso sublinhar, de
defender teses ultrapassadas e populistas, se não demagógicas mesmo,
de sujeição do BC a controles externos, políticos. O que já se viu, no
passado, é a destruição da moeda
sempre que o Banco Central se presta
a ser um financiador compulsório do
déficit público. Isso é inaceitável.
Entretanto, há outra questão, pouco
debatida no Brasil, relativa à distinção entre a ação do BC como gerente
da política monetária e suas ações de
supervisão prudencial.
De um lado há decisões cotidianas,
necessariamente sigilosas e previstas
em qualquer manual de economia,
voltadas para a regulação da liquidez
nos mercados.
Elas exigem operações de assistência de liquidez a instituições que, por
razões circunstancias, chegam ao final do dia com problemas de caixa.
Outra coisa, bem distinta, é a gestão
irresponsável, a opção pela especulação desmedida ou sem lastro mínimo e mesmo a constatação de repetidas irregularidades. Nesses casos,
trata-se de exercer a mais rigorosa
supervisão, com base em regras claras, tanto para os bancos quanto para
as autoridades econômicas.
Uma terceira ordem de problemas
diz respeito aos erros de política econômica, à aposta teimosa ou irresponsável no prolongamento da âncora cambial e mesmo à incompetência técnica na condução de uma
mudança de regime cambial.
A gestão da política monetária é
atribuição convencional do Banco
Central. Os erros de política econômica são lamentáveis, mas as urnas
continuam como o melhor tribunal
dos governantes.
O que é inaceitável, no Brasil, é a
frequente desenvoltura com que as
decisões relativas à supervisão prudencial são tomadas. Sem prestação
de contas, sem transparência, sem
regras ou responsabilização.
A cada vez que o Banco Central usa,
nas palavras do seu atual presidente,
Armínio Fraga, "o seu, o meu, o nosso dinheiro" para socorrer instituições quebradas ou em vias de quebrar, e o faz sem apresentar razões,
dados ou critérios objetivos e transparentes, abre-se um perigoso precedente. Estimula-se a irresponsabilidade tanto entre os bancos quanto
entre os burocratas.
Tudo é feito sempre em nome de
evitar a quebra do sistema, o contágio, o pânico. Mas é preciso perguntar se não se tem abusado muito desse tipo de justificativa.
Em outros países, optou-se pela separação entre gestão da moeda e a
supervisão do sistema financeiro. É
uma idéia que, no caso brasileiro,
merece ampla discussão. Mas isso
não dispensa de modo algum o governo de esclarecer o que se passou
na mudança de regime cambial.
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