São Paulo, Domingo, 04 de Abril de 1999
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A pior de todas as guerras

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

Neste momento em que o mundo se preocupa com uma eventual convulsão européia, a partir de ataques e contra-ataques covardes que ocorrem na Iugoslávia, o Brasil se prepara para entrar numa luta ainda mais séria: a guerra contra os traficantes de drogas.
A declaração de guerra foi solenemente anunciada pelo presidente Fernando Henrique Cardoso na 1ª Reunião Nacional Antidrogas, na quarta-feira passada.
Está aí uma guerra nobre. Num dia de Páscoa como este, diria tratar-se de uma guerra santa, destinada a afastar a juventude da doença, do jogo, do crime e da prostituição.
O que não dá para entender, porém, é o surgimento de outras guerras predatórias dentro da mesma guerra. Refiro-me às disputas de poder que começam a ser travadas entre os órgãos responsáveis pelo combate ao tráfico de drogas.
No âmbito interno, nota-se uma ponta de ciúme entre a Polícia Federal, que até recentemente cuidava daquele combate, e a nova Secretaria Antidrogas, que hoje dá as ordens sobre o que deve ser feito. No âmbito externo, cresce a discordância entre as autoridades americanas, que privilegiam o combate nos postos de saída do Brasil (portos e aeroportos), e as brasileiras, que desejam concentrar esforços nos postos de entrada (regiões de fronteira).
A guerra das burocracias é a pior de todas as guerras. É disso que os traficantes gostam. Enquanto os burocratas disputam o poder, eles expandem suas vendas.
Não podemos ter ilusões. A guerra à droga será a mais longa de todas as guerras e vai exigir ataques nas mais variadas frentes. O consumidor terá de ser um alvo tão importante quanto o produtor e o comerciante. As ações terão de ser tomadas com firmeza, repete-se, em todos os campos.
Será prioritário, é óbvio, proteger os consumidores potenciais: as crianças. O Brasil precisa considerar seriamente a edição de leis que proíbam a circulação de menores desacompanhados nas ruas à noite, a menos que estejam indo ou voltando da escola, e de regras que proíbam o funcionamento de pontos de disseminação de drogas depois das 21h: bares, saunas, casas de massagem, danceterias, clubes noturnos, becos de jogos eletrônicos e outros.
É claro que, nesse rol de atividades, têm a maior importância os programas educacionais e a ajuda de professores preparados e bem remunerados, assim como os programas de combate conduzidos por policiais treinados, bem pagos e sujeitos a rigorosa fiscalização dos órgãos corregedores.
Enfim: estamos no meio de uma grande e complicada guerra para a qual é indispensável uma organização eficaz nos campos da educação e da repressão. Está na hora de se juntar esforços, deixando-se de lado o inglório culto à vaidade.


Antonio Ermírio de Moraes escreve aos domingos nesta coluna.


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