São Paulo, terça-feira, 04 de julho de 2000


Envie esta notícia por e-mail para
assinantes do UOL ou da Folha
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CLÓVIS ROSSI

O clamor do público

SÃO PAULO - De todos os argumentos que podem ser usados para pedir a prisão do senador cassado Luiz Estevão, o único que não vale -mas foi usado- é o do "clamor do público".
Primeiro, porque, a valer tal critério, seria preciso transformar em presídios o Congresso Nacional, todas as Assembléias Legislativas estaduais e todas as Câmaras Municipais. Para o público, todos os senadores, todos os deputados federais e estaduais e todos vereadores são ladrões. Logo, deveriam estar todos presos.
É uma percepção absurda, mas para qual boa parte do mundo político contribui poderosamente.
Em segundo lugar, levar em conta para tomar decisões judiciais o "clamor do público" equivale a transformar os códigos legais em uma espécie de grande circo romano.
Em terceiro lugar, porque o mais importante, no caso de Luiz Estevão como em casos similares, é menos pôr na cadeia os responsáveis e mais recuperar o dinheiro público eventualmente desviado por maracutaias.
Sei que meus argumentos não são exatamente populares. Mas não custa lembrar que o Estado de Direito, uma das raras conquistas da civilização que o Brasil incorporou nos anos mais recentes, pressupõe o mais amplo direito de defesa até para acusados de roubo aos cofres públicos ou de assassinato.
Não custa lembrar também que foi a ruptura do Estado de Direito que ajudou a corromper o aparelho de Estados, nos anos de escuridão do regime militar, por ter-se atribuído a agentes do Estado o direito de decidir no ato quem deveria ser morto ou torturado, em nome dos interesses supremos dos detentores do poder.
Permitir que se utilize o argumento do "clamor popular" para levar alguém à cadeia, seja quem for, é escancarar as portas para a pena de morte e o linchamento de suspeitos de violências, outros dois evidentes "clamores populares".



Texto Anterior: Editorial: DEFENDER MELHOR

Próximo Texto: Brasília - Eliane Cantanhêde: Guerra de rejeições
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.