São Paulo, sábado, 04 de setembro de 2004

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MIGRAÇÃO FISIOLÓGICA

É deplorável o elevado número de mudanças de partido registrado no Congresso Nacional de janeiro de 2003 até agora. Apenas nesse período, aproximadamente um quarto dos deputados federais -cerca de 141 parlamentares- trocou de sigla partidária. Dentre esses casos, alguns configuram uma verdadeira peregrinação por diversas agremiações partidárias. Ilustra bem essa situação a conduta volúvel do deputado Sandro Matos (RJ), atualmente no PTB, que só na atual legislatura trocou três vezes de partido.
Embora extremamente danoso ao sistema representativo, esse movimento migratório não é uma novidade na política do país. Historicamente, a troca de legendas tem sido amplamente praticada por políticos que almejam aproximar-se do poder e incentivada por governos que precisam obter maioria parlamentar. Sabe-se que, durante a gestão Fernando Henrique Cardoso, o PSDB aumentou consideravelmente seus quadros no Congresso, tornando mais fácil a aprovação dos projetos governistas.
Lamentavelmente, a gestão petista não se limitou a dar prosseguimento a essa prática, mas produziu aprimoramentos em sua execução. Convenientemente, não é o PT o principal receptor das adesões, mas as legendas aliadas. Numa prudente "terceirização", partidos da base governista têm prestado o serviço de receber a maior parte dos migrantes. Dessa forma, o PT se beneficia da infidelidade partidária -que tanto criticou no passado-, mas procura manter as aparências de paladino da ética, imagem já bastante arranhada que construiu ao longo de sua história.
Tudo isso apenas confirma a necessidade da tão lembrada, porém sempre adiada, reforma política. Seria um avanço se ela contemplasse uma regra básica: só deveriam poder candidatar-se a um novo mandato ou a outro cargo público eletivo políticos que mantivessem sua filiação ao mesmo partido durante os quatro anos anteriores ao pleito. Normas como essa -para coibir a vergonhosa deserção partidária motivada por interesses de ocasião- contribuiriam muito para o aperfeiçoamento da democracia brasileira.


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