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BORIS FAUSTO
Nem só tristeza
Olhando a história pessoal dos
candidatos à Presidência e vice-presidência da República, impressiona a origem modesta -para usar um
termo genérico- da grande maioria
deles.
É óbvio que a constatação não se estende a toda a classe política nem significa que os canais de ascensão social
estejam abertos, em condições de
igualdade, na sociedade brasileira.
Mas nem por isso podemos ignorar
essas biografias, levando-as à conta de
simples coincidência.
O caso mais impressionante é naturalmente o de Lula -fenômeno até há
alguns anos impensável de ascensão
da pobreza à Presidência da República. Mas, na sua radicalidade, a história
de Lula tendeu a deixar em segundo
plano outras histórias de escalada social e política. Seu companheiro de
chapa -José Alencar- é um exemplo de "self made man", pois partiu de
uma condição só um pouco melhor
do que a de Lula para tornar-se um
poderoso industrial do ramo têxtil.
Os adversários de Lula-Alencar no
segundo turno estavam longe de ser
pessoas de origem privilegiada. Ambos tinham em comum o fato de serem filhos de imigrantes italianos pobres, que, na imagem um tanto batida,
vieram "fazer a América". Mas há
mais: Paulo Pereira da Silva -vice de
Ciro Gomes- foi operário como Lula, e Garotinho é proveniente da baixa
classe média.
Vale a pena meditar sobre as formas
de ascensão social, de experiências
acumuladas, entre as quais se inclui a
comunicação com o grande público,
que permitiram a essas figuras políticas chegar aonde chegaram. Chama a
atenção a variedade de seus caminhos.
Serra representa o caso típico de uma
carreira construída, inicialmente, nos
bancos escolares e no movimento estudantil. Lula e Paulo Pereira da Silva
realizaram sua socialização e a interação com a massa como dirigentes sindicais, numa demonstração de que,
embora o sindicato operário tenha
perdido relevância nos últimos anos, a
experiência nele acumulada em passado recente possibilitou a formação de
importantes lideranças.
Por outro lado, um canal de expressão bem diverso surge nos casos de
Garotinho e de Ciro Gomes. O rádio
foi a via pela qual ambos ganharam
popularidade e aprenderam a se comunicar com públicos amplos, como
a campanha eleitoral demonstrou -
particularmente no caso do primeiro.
Essas histórias diversas, tendo um
ponto de partida comum, guardadas
as diferenças, são exemplos de êxito
de imigrantes, de não poucos migrantes internos e de sindicalistas cujo raio
de ação e de experiência foi possibilitado pela maturação do tão malsinado
capitalismo industrial paulista.
Insisto em lembrar que o caso dessas
figuras, hoje integrantes da elite política, não significa que os caminhos da
ascensão social e da política estejam
plenamente abertos no país. Mas significa que eles existem e ligam-se a
uma variedade de formas de socialização só compatíveis com uma sociedade diversificada. De fato, há muitas razões para tristeza no Brasil, mas o Brasil está longe de ser só tristeza.
Boris Fausto escreve às segundas-feiras nesta
coluna.
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