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São Paulo, quarta-feira, 05 de fevereiro de 2003

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ANTONIO DELFIM NETTO

Qual é a meta?

A área econômica do governo divulgou suas expectativas do crescimento real do PIB, do déficit em conta corrente e a meta inflacionária estabelecida pelo próprio Banco Central. São, de fato, os três parâmetros pelos quais se avalia, normalmente, o desempenho das economias. A tabela abaixo revela esses números e sua comparação com 2002.




Temos uma clara dominância da coluna 2003. Isso significa que, se realizados os seus números, registraremos um inequívoco progresso da economia brasileira depois de muitos anos de quase estagnação e endividamento. A natureza dos números precisa, entretanto, ser esclarecida. O crescimento do PIB deve ser obra do setor privado respondendo à maior ênfase do novo governo ao setor produtivo, acompanhado de ações positivas no direcionamento do crédito e no ataque às deficiências mais notáveis da infra-estrutura. Trata-se mais de "esperança" do que estimativa. O déficit em conta corrente é apenas uma estimativa, talvez a melhor possível, dada a quantidade e qualidade das informações disponíveis no Banco Central. Sua realização depende, entretanto, do comportamento do câmbio, da política de exportação, do crescimento do PIB e da situação internacional.
A "meta" de inflação não é nem previsão, nem estimativa: é um objetivo intermediário, uma tarefa imposta ao Banco Central. Ela foi fixada pelo poder político. É, pois, uma instrução ao BC!
Até agora, pelo menos, o Ministério da Fazenda não respondeu formalmente à carta do presidente do Banco Central: 1º) aceitando ou não a explicação para a violação da meta de 2002; 2º) reconhecendo ou não que ele (Banco Central) fez tudo o que estava ao seu alcance para realizá-la; e 3º) aceitando ou não a aritmética que levou o BC a estabelecer a "meta ajustada" de 8,5%. Tudo foi confundido numa entrevista à imprensa...
Conservou-se a meta original para 2003 (4%, com tolerância para mais ou para menos de 2,5%). O que não se disse é qual a tolerância para o objetivo de dezembro. É difícil aceitar a idéia que 8,4% será o sucesso e 8,6% o fracasso. Mantida a mesma margem, o objetivo intermediário para dezembro de 2003 é uma taxa de inflação entre 6% e 11%, que não seria desastrosa.
Não parece uma boa idéia continuar a atropelar as relações formais entre o Banco Central e o poder político que fixa a "meta". É, portanto, de toda conveniência que no futuro o Ministério da Fazenda "audite" e aprove (ou não), por escrito, a política monetária executada. Não devem prevalecer relações endogâmicas entre o BC autônomo e o poder político que lhe fixa a "meta", porque isso retira credibilidade do sistema.
O aumento simbólico da taxa de juro feita pelo Copom foi na direção correta. Como o próprio BC mostrou, a taxa de inflação anual medida pelo IPCA provavelmente vai continuar crescendo até o terceiro trimestre de 2003. Isso exige a sua mais alta credibilidade para convencer o mercado que o movimento se inverterá e chegaremos a dezembro em torno de 8,5%, objetivo intermediário inarredável. Não é possível dar outro "jeitinho", sem colocar em risco a seriedade do sistema de metas inflacionárias. O BC tem uma tarefa árdua pela frente e precisa da compreensão e apoio da sociedade.

Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta coluna.

E-mail: dep.delfimnetto@camara.gov.br


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