São Paulo, segunda-feira, 05 de maio de 2008

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Derrota providencial

Julgamento do STF tende a limitar edição de medidas provisórias pelo Executivo federal, o que abre margem a reforma

O SUPREMO Tribunal Federal (STF) está prestes a tomar uma decisão que poderá romper um dos piores vícios da democracia brasileira -o inconfessável acordo entre Executivo e Legislativo que transformou as medidas provisórias (MPs) num jogo permanente de chantagens e tráfico de influência.
O que está em causa é o julgamento da ação direta de inconstitucionalidade (Adin) proposta pelo PSDB contra a medida provisória nº 405, de dezembro passado, pela qual o presidente Luiz Inácio Lula da Silva abriu um crédito extraordinário no valor de R$ 5,455 bilhões em favor da Justiça Eleitoral e de diversos órgãos do Executivo.
Na Adin, os tucanos argumentam que a MP não atende aos pressupostos constitucionais da urgência e da relevância previstos no artigo 62 da Carta, nem o da imprevisibilidade, requerida pelo artigo 167 para a abertura de créditos extraordinários.
Cinco ministros já se manifestaram pela inconstitucionalidade da MP. Basta que mais um vote com o relator -o que é dado como certo- para que o governo sofra uma derrota histórica.
Até aqui, o Supremo vinha arquivando todas as ações judiciais contra MPs que tivessem como argumento central a falta de relevância e urgência. O entendimento da corte era que medidas provisórias funcionavam como uma espécie de ato administrativo do Executivo que cabia ao Legislativo chancelar ou recusar. Na discussão dessa preliminar, a maioria dos ministros optou por rever tal interpretação. É justamente esse reposicionamento hermenêutico que traz preocupações ao governo.
Pelas regras atuais, uma MP tem força de lei por 60 dias, renováveis por igual período. Precisa ser aprovada dentro desse prazo pelo Congresso para tornar-se perene e não caducar. A partir do 45º dia de tramitação, ela passa a bloquear a pauta da Casa, ou seja, nada pode ser votado antes dela.
O problema é que, como o Planalto praticamente governa por MPs, a pauta do Legislativo fica inteiramente a reboque do Executivo, o que prejudica o debate parlamentar e atenta contra a repartição dos Poderes.
O que o Supremo Tribunal Federal faz ao abrir a perspectiva de que a relevância e a urgência de cada MP sejam avaliadas pela corte é introduzir uma nova -e salutar- incerteza nos cálculos do governo. Para aprovar seus projetos, o Planalto já não pode contar que bastará baixar a MP e cooptar os parlamentares necessários para a sua aprovação.
A mudança de atitude do STF oferece uma excelente ocasião para que Executivo e Legislativo negociem novas regras para a tramitação de MPs. É preciso fazer com que vigore de fato a noção, já inscrita no texto constitucional, de que se trata de instrumento emergencial -e não de legislação comum, como tem sido.
Ganharia a democracia brasileira, cujo Legislativo se tornaria mais forte e, por conseqüência, mais responsável.


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