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ALBA ZALUAR
País de contrastes
FOI UMA BOA surpresa conhecer os recursos técnicos de
que hoje dispõe a polícia investigativa de São Paulo e de outros
Estados da Federação. Infelizmente, como os demais serviços públicos no Brasil, empregados de modo
desigual e descontínuo.
Enquanto crimes que atingem
pessoas de posses, escolaridade e
relações respeitadas passam pelo
crivo de um instrumental altamente sofisticado para comprovar a
culpa dos acusados, quando se trata de pessoas que instigam desconfiança por serem faveladas, pretas,
pardas, pobres, a desconfiança produz a acusação e a imediata prisão.
Para os primeiros, apesar de alguns erros, a presunção da inocência fica preservada até que as evidências tornem-se cada vez mais
incontestáveis; para os últimos, essa presunção praticamente inexiste. O resultado pode ser mais impunidade para os últimos, porque
processos malfeitos podem ser recusados pelo Judiciário, mas também mais injustiças quando provas
são plantadas de modo que a acusação e a condenação aconteçam.
Basta ser jovem, pobre, favelado
para que os estereótipos postos em
ação resultem em processos algumas vezes kafkianos. Ainda pior
quando o indivíduo (usualmente
chamado de elemento) já tiver sido
condenado por tráfico de drogas.
Mesmo depois de cumprir a pena,
mesmo em liberdade condicional,
a segunda chance lhe é quase sempre negada.
Apesar de a lei penal rezar que a
finalidade da prisão é a recuperação do prisioneiro, dificilmente este é preparado para retomar a vida
na legalidade quando sai dela.
Mesmo assim, cursos profissionalizantes, ofertas de esperança religiosa, pressão de familiares e o
próprio sofrimento atroz que a
perda da liberdade provoca fazem
com que muitos não queiram voltar ao crime.
Assim parece ser o caso de Adauto, preso em blitz policial numa favela carioca portando o cartão de
trabalho no PAC. Esse ex-traficante comparecia regularmente ao Patronato Margarino Torres, em
Benfica, órgão da Secretaria de Administração Penitenciária cujas
funções são: "planejar, desenvolver, coordenar e acompanhar as
atividades pertinentes à Administração Penitenciária no que concerne à custódia, reeducação e
reintegração do preso à comunidade..." Se estivesse foragido, não iria
periodicamente a esse órgão. Mas
foi publicamente apontado, sem a
apresentação de nenhuma prova
ou indício convincente, como o
chefe do tráfico local.
Dois dramas simultâneos, de
grande contraste no que concerne
à postura da polícia. E o crime que
produziu mais cuidados na obtenção de provas e esclarecimentos
públicos foi o que mais horrorizou
a todos.
ALBA ZALUAR escreve às segundas-feiras nesta coluna.
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