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DA ASSEPSIA À INFECÇÃO
O presidente Fernando Henrique
Cardoso sentiu-se obrigado, no domingo, a admitir que falta "assepsia"
no relacionamento entre o governo
federal e o Congresso. "A população
se impacienta, com razão, pela necessidade de negociações nem sempre nos moldes que se gostaria que
elas procedessem", disse FHC.
De fato, há um sentimento mais ou
menos generalizado de que a negociação política, hoje como em governos anteriores, invade o terreno rasteiro da fisiologia, quando não da negociata pura e simples.
Tem que ser assim? A resposta não
é simples. Governos, como o de
FHC, que carecem de uma maioria
estável, pelo menos para aprovar as
reformas constitucionais, são de fato
obrigados a negociar.
O problema está nos limites da negociação. Para usar a imagem empregada pelo próprio presidente, se
houver descuido com a assepsia se
corre o risco de provocar uma infecção generalizada no corpo político.
Parece evidente que, em casos como
o da emenda que introduziu o direito
à reeleição, o governo não respeitou
a assepsia mínima. A compra de votos, atitude que reportagem da Folha
evidenciou, não é uma negociação
tolerável. Se, em outros casos, é difícil estabelecer o teto além do qual a
negociação ultrapassa os limites assépticos, cabe, de todo modo, observar que ao Poder Executivo compete
sempre dar o exemplo.
O candidato Fernando Henrique
Cardoso foi enfático ao decretar o
fim do fisiologismo. O presidente
não pode repetir a ênfase, tanto que
se vê agora obrigado a admitir uma
certa falta de "assepsia".
Espera-se que a admissão não embuta o conformismo com operações
políticas pouco limpas. Afinal, uma
das principais reformas que a sociedade brasileira aguarda é a dos usos e
dos costumes políticos, que, no
mundo inteiro, não têm exatamente
a assepsia perfeita dos melhores
hospitais. De qualquer modo, no entanto, é preciso tomar cuidado com a
possibilidade de infecções.
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