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A campanha presidencial de 98
ROBERTO MANGABEIRA UNGER
Ninguém que só leia os jornais e veja
a televisão tem como compreender a
campanha presidencial que está começando. Repletos de opiniões e fofocas, os jornais minguam em informações. Nem sequer analisam o contexto
que permite entender o significado
das pesquisas de opinião. A televisão
oscila entre o silêncio calculado e o
situacionismo impenitente. Em nenhum lugar transparece a visão que a
elite política e empresarial tem do
quadro atual.
A maioria decisiva do eleitorado
prefere não reeleger o presidente se
encontrar alternativa aceitável. O único candidato oposicionista conhecido
geralmente no país, Lula, não é aceito
pela maioria dos descontentes. Ciro
Gomes continua conhecido por menos de 30% dos eleitores, embora
mais de um terço dos que o conhecem
já digam querer votar nele. O Brasil
como um todo só conhece quatro ou
cinco políticos além do presidente.
Nenhum deles tem como eleger-se.
A posição de Ciro é reveladora. É conhecido pela minoria que lê jornal,
mas não pela maioria que só vê televisão, onde ele e os outros candidatos
declarados ou possíveis da oposição
pouco aparecem. Tem de criar fatos
políticos para vencer a barreira do
desconhecimento, identificar-se com
as ansiedades nacionais e potencializar sua mensagem. A proliferação de
candidatos, conhecidos e aprovados
por partes diferentes do eleitorado,
ajuda a assegurar o segundo turno. E
no segundo turno tudo é diferente.
O presidente vem caindo de aprovação, sem que a oposição suba. Há pesquisas em que o voto indeciso está aumentando em vez de diminuir. Existe
grande preocupação em manter o
real. Convive, porém, com a convicção generalizada de que a estabilidade
da moeda não basta e não deve servir
de pretexto para a inoperância diante
dos problemas do país. As pesquisas
qualitativas confirmam que o ambiente está carregado de frustração e azedume. À descrença no governo contrapõe-se a descrença na oposição conhecida.
Há meses os chefes da oposição insistem no discurso obtuso e inepto da
unidade. O problema nunca foi a desunião das oposições. Sempre foi que
o país ainda não acredita que qualquer uma delas tenha a alternativa
viável que ele quer. Unidas, cairiam
sob a suspeita de terem as mesmas
idéias que tinham quando separadas.
O candidato em torno do qual querem
unir-se não pode ser eleito presidente
agora.
No Brasil partidos não elegem presidentes, embora sustentem governos.
Alianças partidárias capazes de respaldar projetos nacionais transformadores forjam-se no calor da luta que
leva à vitória na eleição presidencial.
Entre os políticos situacionistas e os
grandes empresários é generalizada a
convicção de que o segundo governo
do presidente seria ainda mais triste
do que o primeiro. Nascendo sem
proposta e com base partidária rachada, deixaria o Brasil estagnado. Os
membros dessa elite toleram o continuísmo porque julgam seus interesses
suficientemente atendidos e porque
sabem que não tardará a chegar a hora
das traições proveitosas.
A reeleição do atual presidente depende da ignorância: o desconhecimento popular de alternativa política
a situação que até os operadores do
regime têm como desacreditada. Essa
ignorância não é invencível, nem
mesmo dentro das condições presentes. A campanha presidencial de 98,
que supostamente acabou antes de começar, ameaça agora começar após
haver acabado. A situação fria e fechada de hoje tem tudo para desfecho
sensacional.
Roberto Mangabeira Unger escreve às terças-feiras
nesta coluna.
E-mail: unger@law.harvard.edu
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