São Paulo, sábado, 05 de junho de 2004

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CHICO SANTOS

Em nome da democracia

RIO DE JANEIRO - Os marines, fuzileiros navais americanos, os caubóis e os jogadores de futebol foram meus maiores ídolos na infância de menino do interior. Os jogadores profissionais, eu os conhecia, basicamente, do rádio e das revistas.
Já os marines e os caubóis eram meus velhos companheiros das matinês incendiárias do cineminha de 16 mm da cidade. Às vezes até pintavam uns minutinhos de futebol no inesquecível "Canal 100" para encher de vez o domingo.
Dos filmes de guerra, ficaram para sempre na minha memória os que mostravam os marines desembarcando em uma praia da Europa. Era o Dia D, a invasão da Normandia, que amanhã completa 60 anos. Na tela, em preto-e-branco, era uma guerra limpa e bonita. Os alemães e seus canhões cuspiam fogo, mas nossos heróis eram mais espertos. Ao final, desfilavam sobre seus tanques pelas ruas de Paris, jogando charme hollywoodiano para as mocinhas.
Foi a cruzada da democracia contra o monstro nazista que os americanos muito bem encarnaram e melhor ainda venderam. Tão bem venderam que até hoje alemão é sinônimo de inimigo nas ruas, guetos e presídios sem lei do Rio de Janeiro.
Minhas primeiras noções de liberdade devem ter sido forjadas naquelas tardes de lavagem cerebral dos anos 60.
Tanto que, no Vietnã, demorei a compreender que ali se travava outra guerra. Era apenas um povo querendo decidir seus destinos e um Exército poderoso e cruel dizendo não. Tomou sua lição, mas não a assimilou.
Granada, Panamá e muitas outras intervenções depois, veio essa incrível barbárie do Iraque.
O que é pior, o achincalhe de um povo na prisão de Abu Ghraib cometido pelos "libertadores" ou essa animalesca carnificina na Casa de Custódia de Benfica?
Continuo a gostar dos velhos filmes da Segunda Guerra Mundial, mas os 60 anos do Dia D não mereciam um Bush nas suas comemorações.


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