São Paulo, sábado, 05 de junho de 2004

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LUCIANO MENDES DE ALMEIDA

A rebelião de Benfica

A rebelião na Casa de Custódia de Benfica, no Rio de Janeiro, iniciada no sábado e terminada na noite de segunda-feira (31/5), causou a morte de 30 presos e do agente penitenciário e refém Marco Antonio Borgatte. O mais triste e estarrecedor foi o fato de os presos terem sido torturados e barbaramente assassinados pelos próprios companheiros, como fruto de um confronto entre grupos rivais de traficantes de drogas. Houve muitos feridos.
A maldade foi tão grande que, após um julgamento sumário pelos membros da facção dominadora, decidiram trucidar os colegas com requintes de perversidade até matá-los a golpes de marreta. Vários corpos foram mutilados e carbonizados. Dizem as testemunhas que muitos outros já estavam amarrados para serem igualmente eliminados.
Na história do sistema penitenciário, esta rebelião atingiu o mais alto nível de violência e de covardia entre os próprios detentos, desencadeando um clima de tensão e de revide difícil de ser contido.
A violência tem crescido assustadoramente: assaltos. seqüestros e a brutalidade dos conflitos entre traficantes de drogas. É enorme o número de jovens vítimas dos traficantes e da repressão policial. Parece que a vida não vale mais nada. Como reverter a situação dramática a que chegamos?
O processo de reversão da violência requer a soma de muitas iniciativas e a mudança de mentalidade em busca de um modo novo de conviver. No centro estão a defesa e a promoção da dignidade da pessoa humana, Segue-se a necessidade de medidas pedagógicas e de políticas públicas que convirjam para o relacionamento humano marcado pela justiça, pelo respeito, pela estima e pela garantia de condições dignas de vida.
A maioria dos que incidem no crime o fazem devido à ausência ou à falência do ambiente familiar. O primeiro empenho da sociedade tem de ser pela proteção da família bem constituída, com laços estáveis, e pela possibilidade de habitação e de trabalho. Por que tardar tanto a realizar o assentamento dos sem-terra e o incentivo à agricultura familiar? É urgente que se ofereçam empregos na área urbana, multiplicando o quanto antes os trabalhos que absorvem mão-de-obra, como saneamento, edilícia, limpeza pública e melhoria e manutenção do sistema viário.
A segunda exigência premente é a reforma do sistema prisional. Nosso país trata seus presos de forma desumana, violando a Constituição. Nossos presídios são degradantes e depõem contra o Estado democrático de Direito, negando aos presos o respeito devido à pessoa. As restrições de liberdade não podem ferir a dignidade do ser humano. Entre as medidas urgentes está a necessidade de reduzir a superpopulação nas prisões, de eliminar os maus-tratos, de oferecer atividades laborativas e reeducação, bem como de assegurar a defesa jurídica e o atendimento às famílias dos detentos.
Não podem faltar a atenção e o cuidado com as vítimas da violência e o zelo pela segurança pública, além da luta constante contra o tráfico de drogas
É preciso mais. Temos de descobrir o projeto divino para a humanidade, proclamado por Jesus Cristo, que nos ensina a superar o ódio, a injustiça e a exclusão pelo amor sincero, gratuito e capaz de partilha e de reconciliação fraterna e paz.
Somente o amor pode desarmar a violência.


Dom Luciano Mendes de Almeida escreve aos sábados nesta coluna.


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