São Paulo, terça-feira, 05 de novembro de 2002 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Uma nova unanimidade, crescer PAULO RABELLO DE CASTRO
A eleição de Luiz Inácio Lula da
Silva, se não servisse para mais nada, já teria valido a pena, somente pelo
que já trouxe de contribuição ao estagnado debate das mazelas econômicas e
sociais do nosso Brasil.
Como classificador de risco, dirigindo a SR Rating, há nove anos aferimos o risco Brasil periodicamente. Nosso comitê de classificação, ao longo desses anos, monitorou algo curioso: o risco Brasil, medido por critérios estáveis, econômicos e políticos, quase nada se mexeu desde que Lula disputava a eleição pela segunda vez, em abril de 1994, contra FHC. Naquele ano, nossa classificação inicial era um mediano risco BB- (duplo B, menos), raspando na classe de risco alto de crédito soberano. Quase dez anos depois, entramos em 2003 com a mesma classificação, embora agravada por uma tendência negativa. Ou seja, nosso risco não melhorou nem piorou. Esta é a característica de estagnação que, via taxa de juros alta, detém o crescimento. Pois essa charada acaba de ser "decifrada", na Universidade de Princeton, pelo economista J. A. Scheinkman, segundo relato do jornal "Valor Econômico" (1º/11/02, pág. A3). Essa nova "visão" do crescimento como redutor de risco e indutor de conforto social desperta o interesse de Washington. Até o FMI, segundo Scheinkman, estaria encantado com essa tese, que está se tornando "unanimidade" (sic) entre os economistas no exterior. A novidade, de fato, é o pensamento neoliberal voltar-se para o tema do crescimento. Que o crescimento ajude a afastar um país do precipício econômico, em si, não constitui novidade nenhuma. O novo, a ser comemorado aqui, é o foco, ou seja, o interesse dos neoliberais em lidar, conjunta e articuladamente, com as questões do equilíbrio fiscal e monetário (o doce de coco neoliberal) e com as do crescimento, que arrastam, é claro, os temas correlatos da pobreza, do meio ambiente e da segurança. Faz dez anos, insistíamos nesse ponto, ao apresentar um Programa de Estabilização com Crescimento (PEC), publicado nesta Folha, em primeira mão, ao final de 1991. A idéia central por trás da articulação da estabilização com o crescimento, isto é, equilíbrio macro de curto prazo com inversões decididas e decisivas no longo prazo, estava integrada a um conceito de encontro de contas entre os setores público e privado da economia; necessidade evidenciada pelos recentes clamores dos Estados por re-renegociações de suas dívidas com a União. Enquanto esse encontro de contas, o "mata-mata" de dívidas cruzadas, não for enfrentado -e isso implica o envolvimento das contas da Previdência Social e dos fundos sociais (daí a centralidade dessas reformas)-, enquanto essas pendências, que o atual governo chama de "esqueletos", não forem equacionadas, o Brasil persistirá nessa espécie de "concordata branca", que não nos levará a nenhum "default" da dívida, mas tampouco nos livrará da síndrome do juro alto com tendência à estagnação da produção. Isso acabaram de descobrir os neoliberais no exterior, motivo de nossa grande satisfação, já que agora o diálogo começa a se tornar possível. Se esse compromisso de crescer se concretizar, poderemos saudar o mandato de Luiz Inácio como o verdadeiro pacto social por ele tão desejado. Paulo Rabello de Castro, 53, doutor em economia pela Universidade de Chicago (EUA), é vice-presidente do Instituto Atlântico (RJ). Escreve às quartas-feiras, a cada 15 dias, na seção "Opinião Econômica", do caderno Dinheiro. E-mail: paulo@rcconsultores.com.br Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Arnaldo Carrilho: Acerto de contas Índice |
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