São Paulo, sábado, 06 de março de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES

Ao contrário

SÃO PAULO - Ao se atrapalhar com a batata quente do "Waldogate" e ao tentar, de forma desastrada, seguir o tradicional manual de medidas a serem tomadas em caso de crise (convocar aliados de prestígio intelectual para dourar a pílula, criar fatos artificiais, lançar balões de ensaio e sufocar CPIs), o governo petista vai sepultando mais uma esperança que o cercava: a de que seria politicamente menos igual aos que o antecederam.
Tudo indica que o Planalto conseguirá abafar novos desdobramentos do caso, mas não há como afastar a sensação de que suas perspectivas se tornaram mais sombrias do que eram dois meses atrás.
Depois de ter usado muito de seu cacife inicial na tentativa de "construir credibilidade", adotando a agenda dos mercados e uma política monetária bastante conservadora, o governo terminou 2003 podendo contrapor alguns indicadores satisfatórios ao previsível desastre da paralisia econômica.
Se as balas perdidas do Banco Central produziram danos desnecessários, a trajetória dos juros estava em queda e coordenava as expectativas para um ano de retomada do crescimento. Num ambiente menos pressionado, as correções de rumo afiguravam-se mais factíveis. O governo mal ou bem preservara prestígio político e, com ele, ainda uma boa margem de manobra. Em resumo: com todos os erros grosseiros, com toda a inépcia administrativa e com todas as frustrações quanto à realização de promessas de campanha, parecia que as coisas ainda poderiam ser de alguma forma "salvas" em 2004.
Foi essa possibilidade que se estreitou. Se a autonomia política encolheu, o ânimo dos agentes econômicos se abateu. Não apenas pelas conseqüências do episódio, mas também por ele ter coincidido com uma mudança no cenário: temendo descumprir a meta de inflação de 5,5% para este ano (que já se revelou problemática), o BC segurou a queda dos juros. Ou seja, na política e na economia, o ano começou ao contrário.



Texto Anterior: Editoriais: MAU COMEÇO

Próximo Texto: Brasília - Fernando Rodrigues: Lula e a "CPI-fobia"
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.