São Paulo, sexta-feira, 06 de março de 2009

Próximo Texto | Índice

Editoriais

editoriais@uol.com.br

Mais retrocesso

Conflito comercial com Argentina mostra que 18 anos de Mercosul não bastaram para assegurar o livre comércio no bloco

O CONFLITO comercial entre o Brasil e a Argentina, aguçado pelo ambiente global de retração da atividade econômica, teve novos desdobramentos. Dada a propensão dos argentinos para adotar, por meio de decisões unilaterais, barreiras à entrada de exportações brasileiras, o governo Lula continua descartando retaliações e se inclina a propor que ao menos tais barreiras sejam pactuadas entre os dois países.
As autoridades cogitam admitir que as vendas brasileiras de certos bens -como eletrodomésticos, têxteis e calçados - fiquem sujeitas a limitações quantitativas. Essas cotas poderiam ser negociadas entre os empresários dos dois países, sob a mediação dos respectivos governos.
Em contrapartida, seriam suspensos os mecanismos que hoje emperram a entrada desses produtos no mercado argentino. É o caso da demora extraordinária, e obviamente deliberada, na liberação de licenças de importação.
O governo brasileiro vê oportunidade, ainda, de debater com a Argentina um mecanismo comum de defesa comercial, destinado a deter a invasão de exportações chinesas. Não se sabe qual seria o desenho dessa defesa conjunta -mas a China, ao aderir tardiamente à Organização Mundial do Comércio, aceitou sujeitar-se a salvaguardas do tipo, impostas por outros membros da organização.
O episódio, embora ainda sem desfecho, suscita certo incômodo. Denota o quanto ainda é precário o arranjo do Mercosul e de sua extensão ao restante da América do Sul -precariedade que leva o Brasil a ver-se, volta e meia, chantageado por sócios e parceiros menores.
Na condição de sócio de maior porte e com economia mais sofisticada, é natural que o Brasil arque com boa parte do ônus da integração regional. É estranho, sob esse ponto de vista, que o saldo comercial entre Brasil e Argentina mantenha-se desfavorável ao vizinho desde 2003.
Se é natural, de todo modo, que as maiores concessões partam do lado brasileiro, tal sacrifício só fará sentido se tiver como contrapartida a liberalização progressiva do ambiente de negócios na região. Entretanto, o contencioso com a Argentina é mais um elemento a demostrar que, 18 anos após a fundação do Mercosul, nem sequer o objetivo básico do bloco, o livre comércio entre seus integrantes, está imune a sabotagens e retrocessos.


Próximo Texto: Editoriais: Vírus inabalável

Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.