São Paulo, segunda-feira, 06 de maio de 2002

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BORIS FAUSTO

Lula e os riscos

O sinal de alarme tocado por algumas instituições financeiras internacionais, em torno da candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva, colocou na ordem do dia a questão das consequências de uma eventual vitória do candidato petista.
Em primeiro lugar, é preciso distinguir uma análise ditada pelos interesses do país daquela formulada por instituições financeiras. Estas, por sua natureza, e não por alguma maldade intrínseca, voltam-se para a avaliação de risco e segurança dos investimentos que promovem.
Nessa perspectiva, o que mais lhes interessa é a estabilidade interna de um país, o equilíbrio de suas contas fiscais e externas, como fatores indicativos de que seus compromissos, tanto públicos quanto privados, serão cumpridos. Outros fatores, que no nosso caso são de importância central -como a preservação da democracia, a redução das desigualdades sociais-, são vistos, nessa ótica, como relativamente secundários.
A diferença de perspectiva não significa, entretanto, que podemos nos dar ao luxo de ignorar o sinal amarelo. O próprio sinal representa um sintoma preocupante, pois revela os riscos que pairam sobre o financiamento da dívida e a entrada de novos investimentos, ambos indispensáveis para a estabilidade interna e o crescimento.
Muito do avanço da candidatura Lula, nas pesquisas recentes, tem a ver com sensações afetivas e emocionais. Na medida em que o radicalismo de Lula e da corrente majoritária do partido parecem ser coisa do passado, cresceram outros elementos de percepção: a origem do candidato, a insistência genérica nos temas sociais, a maior consistência comparativa do Partido dos Trabalhadores.
Mas, como se tem destacado, Lula quase sempre não passa do nível das generalidades, tocando em problemas que são uma unanimidade nacional. Quando escapa das generalidades, diz coisas que mostram seu desconhecimento de como funciona a economia de um país. Não vou insistir nos exemplos, pois eles são conhecidos.
No plano das relações internacionais, tudo se resume a alguns slogans contra a hegemonia americana, sem tentar enfrentar a questão central: a política do atual governo brasileiro, no sentido de abrir espaços à presença do país no mundo e afirmar, ao mesmo tempo, sua autonomia, deveria ser alterada? O entusiasmo de Lula, desde a primeira hora, por Hugo Chávez e as simpatias por Fidel Castro não dão margem a muitas esperanças de um comportamento que saiba dosar firmeza, equilíbrio e bom senso.
Em mais de 20 anos, Lula cresceu em verbalização, em imagem bem comportada, em capacidade de jogar o jogo da picardia política, mas não conseguiu avançar -ou melhor, não quis avançar- na compreensão das questões fundamentais do país. O problema nada tem a ver com sua origem popular, pois oportunidades, em todos esses anos, não lhe faltaram.
Essas constatações indicam que a candidatura de Lula representa um risco? É preciso afirmar, com todas as letras, que sim; sem temer críticas e incompreensões. O jogo eleitoral ainda vai dar muitas voltas e, quem sabe, reviravoltas, mas é tempo de começar a dar nome aos bois.


Boris Fausto escreve às segundas-feiras nesta coluna.



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