São Paulo, quinta-feira, 06 de julho de 2000


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CARLOS HEITOR CONY

Boa pergunta

PARIS - Recebi com atraso o jornal que veio do Brasil, sentei numa daquelas cadeiras de vime do Café de la Paix e comecei a ler as notícias pátrias. Abri escandalosamente a folha, deixando a manchete da primeira página bem à mostra. Não demorou muito, um cidadão parou na calçada e tentou ler.
Percebendo isso, facilitei-lhe a tarefa. Expus totalmente a primeira página bem à sua frente. Ele tinha dificuldade de ler ou de entender, mas sem dúvida estava curioso. Ao virar uma folha interna, dei uma olhada na manchete que chamara a atenção de um francês desocupado que por ali passava.
A manchete dizia que, afinal, um suposto corrupto ia para a cadeia. Era o assunto principal daquela edição o caso do ex-senador Luiz Estevão.
O homem continuou tentando decifrar o resto da matéria. Que interesse poderia ter ele com nossas desditas? Ao tomar mais um gole do café, aproveitei e recolhi o jornal por um instante. O homem ficou vermelho, envergonhado de ter sido apanhado em flagrante, filando a minha leitura.
Para deixá-lo à vontade, ofereci-lhe o jornal, mas antes perguntei se ele compreendia o português. Sim, compreendia, vivera mais de 15 anos em Portugal, já viera ao Brasil mais de cinco vezes, tinha parentes em Santa Catarina.
Antes de ir embora, perguntou-me quantos habitantes tem o Brasil. Respondi que, aproximadamente, estávamos com 160 milhões de patrícios. "Muita gente", comentou ele.
E, achando-me acolhedor, perguntou polidamente se eu não me incomodaria em responder a uma curiosidade pessoal dele. Garanti que não, teria prazer de esclarecê-lo, caso soubesse a resposta.
A pergunta que ele me fez, aliás, não teve resposta mesmo: "Por que, com tantos milhões de brasileiros, apenas um ia para a cadeia?".


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