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LUCIANO MENDES DE ALMEIDA
Amar primeiro
O Papa João Paulo 2º, após o Jubileu do Ano 2000, escreveu o precioso documento "Novo Millennio
Ineunte", no qual convoca a Igreja a
ser fermento da sociedade humana
pela vivência da caridade e do amor
divino em nós.
No cerne dessa caridade está o espírito de comunhão cuja origem se encontra na perfeição da união trinitária.
O Pai, o Filho e o Espírito Santo são,
para nós, a fonte e o modelo da comunhão. As pessoas divinas estão unidas
pelo amor que circula entre elas e que
se manifesta na criação do mundo e
na salvação da humanidade. Nessa
obra divina, resplandece a gratuidade
do amor. O apóstolo são João (1 Jo.
4,10) ensina-nos que Deus nos "amou
primeiro". Antes que fôssemos capazes de amar, ele envolveu-nos com a
sua infinita misericórdia. Assim, o
amor divino para conosco não depende de nossa resposta. Supera-a. Seu
amor é sempre novo. Não somos
amados por Deus por sermos bons,
mas tornamo-nos bons porque Ele
nos ama e nos justifica. Deus é Pai que
se alegra ao compartilhar conosco
seus bens, suas graças e os frutos de
sua caridade.
Amar com o coração de Deus significa aprender com Jesus Cristo a
"amar primeiro". Deus é gratuidade.
Nós somos chamados a reconhecer e a
agradecer a sua caridade, a deixarmo-nos possuir por ela e a viver, como filhos e filhas de Deus, o amor primeiro
em relação ao nosso próximo. A iniciativa é sempre de Deus. A nós cabe
acreditar no seu amor e expressar a
alegria da gratidão filial, a exemplo da
Virgem Maria. No entanto, para os irmãos, podemos e devemos imitar o
amor primeiro de Deus e também tomar a iniciativa da caridade.
No mundo de hoje, as pessoas não
procedem assim, mas bloqueiam a
gratuidade e buscam os próprios interesses na ânsia de possuir mais -com
esquecimento e até opressão do próximo. O egoísmo destrói os gestos gratuitos e condena o mundo à miséria, à
frieza e à destruição da vida.
Amar com o coração de Deus é lançar na sociedade excludente sementes
de bondade que hão de vencer o mal
com o bem, ajudando os outros a viver e a descobrir, por sua vez, a beleza
da gratuidade.
É esse amor primeiro, ensinado por
Jesus, que há de salvar a humanidade
do ódio que leva à violência e da injustiça que provoca a fome e o desespero.
O único modo de superar a vingança é
o perdão. Quem perdoa faz a experiência do primeiro amor, a exemplo
de Cristo. Quem ama dá o primeiro
passo antes mesmo que o outro se arrependa e procura os caminhos de reconciliação.
Diante das desigualdades sociais, da
acumulação doentia de bens materiais
-que acarreta a miséria e a asfixia de
milhões de excluídos- e do abandono de crianças e de idosos, somente o
amor gratuito consegue dissolver o
coração de pedra e abrir-se à partilha
fraterna e à alegria de promover a vida
do próximo. Anuncia o "amor a fundo perdido", o convite para a festa feito "aos cegos, aos coxos, doentes e pobres" (Lc. 14,14).
A quantos irmãos e irmãs poderemos hoje levar a mensagem da concórdia e da esperança se entrarmos, o
quanto antes, na escola da caridade
cristã, do perdão e da partilha! Não
haverá mais desamparados com fome, jovens sem horizontes ou ricos fechados no egoísmo. No amor primeiro ao próximo, em sintonia com o coração de Cristo, encontraremos a misteriosa novidade do Evangelho:
"Maior a alegria de quem dá" (At.
20,55).
Com a graça divina será possível começar nessa vida a realizar esse sonho.
D. Luciano Mendes de Almeida escreve aos sábados nesta coluna.
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