São Paulo, quarta-feira, 06 de novembro de 2002

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TENDÊNCIAS/DEBATES

O crescimento da produção científica

PAULO RENATO SOUZA

A evolução da produção científica brasileira tem sido objeto de muitas análises e debates. Cientistas de diferentes áreas acompanham com interesse o aumento da produção de nossos pesquisadores e da sua participação relativa na produção científica mundial. Conclusões e argumentos diversos são divulgados, quase sempre ilustrados por dados de múltiplas fontes.
Esse interesse vem sendo, em grande parte, estimulado e viabilizado por uma importante iniciativa da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) e do Ministério da Educação: o Portal de Periódicos. A Capes adquire das editoras internacionais o direito de consulta e "download" gratuitos do conteúdo de milhares de periódicos e de bases de referências bibliográficas, e viabiliza o acesso, via internet, para os membros das instituições de ensino superior e de pesquisa.
Tal iniciativa permite a superação de um dos maiores obstáculos enfrentados pelos pesquisadores de qualquer país: o acesso rápido à produção científica e tecnológica mundial devidamente atualizada. São 13 bases referenciais e mais de 3.000 periódicos científicos publicados a partir de 1995. O número de beneficiários é, atualmente, de cerca de 1 milhão de professores e alunos de graduação e pós-graduação. O total anual de acessos cresce continuamente: em 2001 foram mais de 3 milhões; em 2002, a média mensal é de mais de 500 mil.
Além disso, o portal é um importante instrumento de superação de desigualdades regionais. O mesmo acervo disponibilizado para uma tradicional instituição do Sudeste o é também para todas as demais instituições que dele participam. O portal introduziu uma mudança na cultura acadêmica, alterando a relação de pesquisadores com as editoras das principais revistas internacionais, dando maior visibilidade à produção científica brasileira, cuja participação mundial é cada vez maior.
Considerando que não existe consenso internacional sobre como medir e avaliar a produção intelectual e acadêmica, é fundamental que, nas análises efetuadas, sejam explicitados o conceito de produção científica nacional, quais os itens de produção nela incluídos e a fonte de dados adotada.
Para demonstrar, por exemplo, o estágio de nossa produção científica em relação à produção mundial, uma ótima fonte é a publicação "National Science Indicators" (NSI), do Institute for Scientific Information (ISI). No cálculo desses indicadores, o instituto inclui apenas "articles, notes, reviews e proceedings papers" de periódicos por ele indexados segundo critérios rigorosos, consagrados no meio científico internacional. Tais indicadores, cujo uso fica imune a eventuais acusações de manipulação por agência governamental brasileira, comprovam o aumento de nossa produção científica e da participação desta na produção mundial.


O acompanhamento da pós-graduação indica que esse sistema, além de se manter em expansão, eleva sua qualidade


Os dados evidenciam que, nas duas últimas décadas, nossa capacidade científica cresceu ano a ano, a um ritmo cada vez mais intenso. Necessitamos de dez anos para duplicar a capacidade de produção científica que tínhamos em 1981; alcançamos o triplo dessa produção cinco anos depois, em 1995; o quádruplo em 1998; o quíntuplo em 2001; o sêxtuplo, muito provavelmente, será superado em 2002.
O aumento da capacidade nacional de geração de ciência ganha relevo quando o comparamos ao crescimento da produção científica mundial. A produção brasileira em 1991 foi 106% superior a sua produção em 1981; a mundial, 30%. Em 2001, a brasileira foi 167% superior à de 1991; a mundial, 27%. Na última década, mais do que duplicamos nossa participação na produção científica mundial, tendo sido esse crescimento sempre contínuo de 1994 a 2001. Aliás, nesse período, a produção brasileira cresceu 117%; a mundial, 15%; e a nossa participação nesta, 88%.
O ranking da participação dos países na produção científica mundial, dos indicadores ISI/NSI, destaca outro fato significativo: a elevação da posição do Brasil. Em 1981, ocupávamos a 26ª posição; em 1991, a 22ª; e em 2001 já ocupávamos a 18ª posição. Estamos à frente de muitos países com longa tradição educacional e de pesquisa, como Bélgica, Áustria e Finlândia. Na América Latina, o segundo país a figurar no ranking é o México, em 27º lugar, com metade de nossa produção.
Na base desse aumento da capacidade científica do Brasil está o desenvolvimento da pós-graduação nacional. Nossa competência na formação de mestres e doutores vem aumentando em ritmo crescente. Dois indicadores -número de cursos e de titulados por ano- demonstram o crescimento, com destaque para o aumento da formação de doutores: 1.370% em 20 anos -uma evidência do aumento da maturidade do sistema. Todos os demais indicadores mostram também altos índices de crescimento ou de melhoria de desempenho.
Sobre as perspectivas da produção científica brasileira nos próximos anos, os indicadores são alvissareiros: o acompanhamento anual da pós-graduação indica que esse sistema, além de se manter em forte expansão, eleva sua qualidade. O desenvolvimento da pós-graduação pressupõe, para a sustentação do processo de formação de mestres e doutores, o desenvolvimento da pesquisa científica e, ao mesmo tempo, é fator de desenvolvimento desta, uma vez que são os programas desse nível de ensino os principais responsáveis, no Brasil, pela geração do conhecimento científico e tecnológico.
Se mantido o apoio à pós-graduação e aos programas de fomento da Capes, é possível prever o aumento, em ritmo cada vez mais intenso, da produção científica nacional.


Paulo Renato Souza, 57, economista, é ministro da Educação. Foi reitor da Unicamp (1986-90) e secretário da Educação do Estado de São Paulo (governo Franco Montoro).


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