São Paulo, terça-feira, 07 de janeiro de 2003

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TUDO PELO SOCIAL

O bordão a que se refere o título deste editorial foi a principal marca da propaganda do governo José Sarney (1985-1989). Ele refletia um antigo anseio da sociedade brasileira -o de atacar o flagelo da pobreza e da concentração de renda-, renovado após a redemocratização. A frase automaticamente vem à mente depois das primeiras manifestações propriamente executivas do governo de Luiz Inácio Lula da Silva.
Parece que, mais que prioridade da gestão, o "social" vai-se tornando um termo capaz de justificar qualquer medida que interfira na destinação de recursos federais. Na sexta-feira, dia da primeira reunião ministerial, confirmou-se a notícia, já veiculada pouco antes, de que Lula decidiu adiar a licitação para a compra de novos jatos para a Força Aérea Brasileira. A justificativa oficial foi a de que os recursos seriam mais bem utilizados no combate à fome. Mas deixar de realizar a compra não significa liberar recursos para o Fome Zero.
O segundo emprego exagerado do "social" foi dado pelo ministro dos Transportes, Anderson Adauto (PL), que suspendeu todas as licitações para obras de infra-estrutura em transportes. Declarou que a prioridade do novo governo são ações sociais, e não a construção de novas rodovias. Mais tarde disse que tapar buracos das estradas era uma ação social.
Essas duas passagens podem ser enquadradas numa trajetória que vem desde a campanha petista pela Presidência: trata-se da tentativa de dissimular o balanço de prejudicados e beneficiados pela ação do governo. As Forças Armadas, bajuladas pelo então candidato petista, por certo não estão contentes com o adiamento da compra dos caças. Tampouco os concorrentes nas licitações da FAB e de novas estradas estão satisfeitos com a sua involuntária contribuição para o "social".
Talvez a renovação implícita do mote "tudo pelo social" tenha apenas sucedido, nesse início de governo, o "paz e amor" que prevaleceu na campanha. Se este emplacou, atribuir toda e qualquer mudança nos gastos públicos a necessidades sociais já deu mostras suficientes de que não convence.


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