São Paulo, sábado, 07 de janeiro de 2006

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IGOR GIELOW

Fora dos eixos

BRASÍLIA - A eleição de Evo Morales como presidente da Bolívia, talvez a coisa mais "bolivariana" que Hugo Chávez patrocinou desde que se consolidou como emir petrolífero da América do Sul, colocou o Brasil numa situação delicada. Não menos porque o presidente Lula apoiou o líder cocaleiro.
Imediatamente, Morales e Chávez se uniram a Fidel Castro para lançar um certo "eixo do bem", contraposição aos malvados broncos que ocupam a Casa Branca, invadem países ricos em hidrocarbonetos e tacham todos os que não rezam por sua cartilha de integrantes do "eixo do mal". Não dá. Uma coisa é ser crítico aos EUA, outra é ser pueril.
Felizmente, o Brasil não embarcou nessa. Pelo menos é o que se lê nas palavras do chanceler Celso Amorim, que afirmou pretender usar o peso regional brasileiro para "amortecer" a agressividade de Morales.
Na verdade, o Brasil está preocupado com os negócios da Petrobras com o gás boliviano, que correm riscos caso Morales resolva bancar o durão. Mas a temperança, num momento em que o Itamaraty está transbordando de soberba pelo destaque (não perguntem o resultado, pois é incerto) de Amorim nas negociações da Rodada Doha, é ótima notícia.
O governo vive uma relação ciclotímica com seus "hermanos" mais radicais. Ora dá um gelo em Chávez, que, montado em barris de petróleo, tem vôo próprio, ora o adula. Isso quando não escorrega, como quando Lula e Chávez se uniram num ataque às "elites golpistas".
Com Morales, Chávez ganha um aliado com o mesmo ativo: energia. Além disso, suas hostes podem crescer com a eventual vitória do militar amalucado Ollanta Humala na disputa pela Presidência do Peru.
Assim, o governo está diante de um jogo complexo, que inclui administrar eventuais bobagens que Lula fale no palanque e, ao mesmo tempo, não engrossar a campanha antiamericana regional -a posse de Morales, no dia 22, é um bom teste. Até porque tem muito mais a perder que seus amigos "bolivarianos".


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