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MÍNIMO SEM FUNDO
Em torno da discussão sobre o aumento do salário mínimo, surgiu a
idéia de lastrear uma correção mais
generosa do piso salarial no Fundo
de Combate e Erradicação da Pobreza, projeto que tramita no Congresso
Nacional. Um acordo entre parlamentares e área econômica do governo federal reservou R$ 4 bilhões
anuais para o novo fundo.
Para justificar que parte dessa verba
seja destinada a um aumento mais
substancial do mínimo, há um argumento que merece ser considerado.
A política do salário mínimo funciona, e razoavelmente bem, como um
grande programa social no Brasil.
Dos 18 milhões de beneficiários da
Previdência Social, cerca de 12 milhões recebem um salário mínimo.
Destes, perto de 8 milhões obtêm os
R$ 136 sem ter necessariamente contribuído para o INSS. Trata-se de setores sociais aos quais foi concedido
o direito de acesso ao seguro social
pela Carta de 1988 -com especial
destaque para a aposentadoria rural-, o que ampliou significativamente a cobertura da Previdência, caracterizando-a, assim, também como um grande programa de transferência direta de renda, com impacto
redistributivo. O dispêndio com benefícios somente no setor rural é da
ordem de R$ 10 bilhões ao ano.
Não foram desprezíveis os efeitos
dessa mudança em algumas regiões
pobres. Estudo do pesquisador do
Ipea (instituto de pesquisas do governo federal) Guilherme Delgado mostra que o acesso ao benefício significou efetivo ganho de renda para as famílias que subsistem da pequena
agricultura nas regiões Nordeste e
Sul, cuja situação de pobreza vinha
progressivamente se agravando.
Pode parecer, pois, justificável que
se direcionem recursos do fundo da
pobreza para o programa social da
Previdência, mediante aumento do
salário mínimo. O problema é que,
com essa escolha, perde-se uma
chance rara de utilizar o fundo, com
toda a sua verba e quem sabe alguma
mais, para um grande programa nacional de transferência de renda para
garantir às famílias mais pobres suas
necessidades alimentares básicas.
O programa social da Previdência,
que, portanto, também transfere renda para famílias pobres, tem, porém,
um público-alvo mais restrito (idosos e inválidos apenas) do que seria o
de um programa nacional de complementação de orçamentos.
Com R$ 5 bilhões anuais, seria possível saciar a fome de 21 milhões de
brasileiros abaixo da linha da pobreza. O cálculo é de Lena Lavinas, também pesquisadora do Ipea. Isso sem
falar nos ganhos sociais adicionais
que alguns programas de transferência de renda em execução vêm obtendo. O mais conhecido deles é o bolsa-escola, que condiciona o pagamento
do estipêndio à frequência escolar
dos filhos das famílias beneficiadas.
Assim, não seria proveitoso retirar
os já exíguos recursos do fundo da
pobreza e direcioná-los para o salário
mínimo. Há que buscar, com responsabilidade, em outras rubricas do
Orçamento a forma de financiar um
aumento real para o mínimo.
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