São Paulo, sexta-feira, 07 de junho de 2002

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LEI E REALIDADE

Ao que tudo indica, não devem acontecer as perdas fiscais previstas pelo governo com a suspensão da cobrança da CPMF. O Senado suprimiu do texto da emenda constitucional que reinstala a contribuição o dispositivo pelo qual a sua entrada em vigência deveria aguardar 90 dias a partir da promulgação da lei. Sem ter de cumprir essa carência, haverá nenhuma (ou brevíssima) interrupção no fluxo de recursos que a CPMF direciona para o Tesouro. Trata-se de manobra juridicamente arriscada.
A premissa de que as contribuições sociais entram em vigor apenas após a noventena está inscrita na Constituição. Portanto, a dificuldade jurídica não desaparecerá simplesmente suprimindo o prazo de carência da emenda. Além disso, pelo fato de o texto que saiu da Câmara ter sido modificado no Senado, a ortodoxia recomenda que seja reenviado aos deputados para nova avaliação.
Para evitar, sem maiores traumas, um "rombo" nas contas públicas, governo e parlamentares optaram por correr riscos jurídicos. A dificuldade do Executivo de garantir a continuidade da cobrança da CPMF é uma das notícias que têm sido interpretadas como ruins por agentes do mercado. Sem ter mais que ajustar as suas contas a uma situação em que a CPMF deixaria de ser cobrada por algum tempo, o governo pode voltar atrás de sua disposição de cortar R$ 5 bilhões do Orçamento e de aumentar a alíquota de outros tributos.
O Supremo provavelmente será acionado para decidir a validade da emenda da CPMF. Poucos acreditam que os ministros derrubem a medida. O melhor para serenar os ânimos exaltados do momento e para garantir transição de governo minimamente segura seria a não-interrupção da cobrança da contribuição. Mas fica do episódio uma sensação, ruim, de que, quando a premência econômica, social ou política bate à porta, o zelo no cumprimento dos ritos institucionais se afrouxa.


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