São Paulo, quinta-feira, 07 de junho de 2007

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KENNETH MAXWELL

Victoria e Camilla

O NOVO estádio de Wembley recebeu Brasil e Inglaterra para um amistoso, que terminou em empate, resultado até razoável. E David Beckham reconquistou parte de seu prestígio junto à torcida britânica.
Mas os rumores que se ouviam fora de campo envolviam menos o jogo do que a possibilidade de que Beckham viesse a ser sagrado cavaleiro na lista final de honrarias recomendadas pelo primeiro-ministro Tony Blair antes que ele deixe o cargo. No caso de Beckham, ao que parece, o problema é sua mulher, Victoria. A questão proposta pelos sábios da imprensa era a seguinte: será que uma antiga Spice Girl pode se tornar uma lady? O outro drama da semana envolvia um especial de televisão chamado "Queen Camilla". Trata-se de mais uma tentativa dos amigos do príncipe Charles de tornar a intragável senhora Camilla Bowles, agora duquesa da Cornualha, mais palatável aos olhos de um público britânico ainda saudoso da era de glamour associada à princesa Diana.
O argumento era que o príncipe Charles sempre foi um sujeito esquisito demais para ser rei, mas agora que sua amante por muito tempo e verdadeiro amor de sua vida, Camilla, está ao lado dele como esposa, ela garantiria que o príncipe se mantenha na linha -comportando-se, na prática, como "sua mãe", nas palavras do programa, de modo que Charles, com a ajuda dela, poderia enfim encontrar sucesso como monarca.
Quando isso acontecer, argumentava o programa, o povo britânico viria a compreender que o sucesso dele se deve inteiramente ao apoio da sofrida, silenciosa e nada glamourosa Camilla, o que resultaria no surgimento de uma rainha Camilla digna de amor. E Camilla, dessa maneira, substituiria para sempre, na mente do público, a persistente memória da "princesa do povo".
Trata-se, evidentemente, de uma história de Cinderela em sentido inverso. Agora, é a irmã feia que retorna triunfante para conquistar o príncipe encantado, na verdade nem tão encantado assim.
Mas, no confuso mundo do moralismo público britânico, o que justifica, então, toda a boataria sobre a aceitabilidade de Beckham como detentor do título de cavaleiro, que pode ou não ser conferido a ele como parte da última lista de honrarias de Tony Blair? Já que o adultério triunfou no topo, por assim dizer -esposa morta, amante vitoriosa-, o que há de tão errado quanto a um histórico como Spice Girl? Se teremos uma rainha Camilla, por que não uma lady Victoria Beckham?
As coisas com certeza eram muito mais simples na era do velho estádio de Wembley, quando o Brasil enfrentava a Inglaterra. Então, todo mundo sabia que Pelé era o rei.


KENNETH MAXWELL escreve às quintas-feiras nesta coluna.

Tradução de Paulo Migliacci


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