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BORIS FAUSTO
O caso dos Rosenberg
Poucas pessoas das gerações
mais novas sabem o que foi o caso
dos Rosenberg, cujo desfecho ocorreu
há 50 anos. Não será, pois, excessivo
relatá-lo brevemente. Julius Rosenberg, casado com Ethel, era um físico
nuclear judeu a serviço do governo
americano, sendo tanto ele quanto a
mulher ligados ao Partido Comunista
dos Estados Unidos. Em meados de
1950, ambos foram presos sob a acusação de espionagem, pois teriam entregue, por volta de 1945, desenhos da
bomba atômica à União Soviética. A
traição teria sido muito grave, a ponto
de possibilitar aos russos quebrar o
monopólio da fabricação da bomba,
até aquela altura detido pelos americanos.
O processo dos Rosenberg se desenrolou acumulando equívocos e demonstrações da fraqueza humana.
Mal defendidos, traídos pelas declarações de um irmão de Ethel, que assim
salvou sua pele, os Rosenberg foram
condenados em 1951 à morte na cadeira elétrica e eletrocutados 26 meses
depois, na prisão de Sing Sing, em Nova York.
Hoje, a questão da culpa do casal é
menos importante do que as considerações sobre a manipulação desse drama. Em todo caso, são muito fortes os
indícios de que Julius forneceu aos soviéticos alguns desenhos sobre a bomba, sem a importância que lhes foi
atribuída, isso por convicções ideológicas, no curso da Segunda Guerra
Mundial. Seja como for, eles foram vítimas de um jogo de interesses, em
pleno curso da Guerra Fria e do macartismo nos Estados Unidos, numa
época marcada pela detonação da primeira bomba atômica soviética e pela
invasão da Coréia do Sul pela do Norte
e pelos chineses. Também pesou, em
desfavor do casal, um anti-semitismo
ainda vigente em muitos círculos dirigentes.
A grande mobilização mundial em
favor dos Rosenberg -até o último
momento esperava-se a comutação
da pena pelo presidente Eisenhower- foi um capítulo comovente da
história dos anos 50. Nem por isso devemos esquecer que a União Soviética
orquestrou muitas manifestações, como instrumento propício para denunciar o imperialismo americano.
Como muita gente ainda acreditava
na "pátria do socialismo", o genocídio
praticado por Stálin e seus acólitos podia ser levado à conta de fantasia reacionária.
Nos 50 anos que se seguiram à execução dos Rosenberg, muita coisa
mudou nos dois países em confronto.
A União Soviética ruiu, a hegemonia
americana se concretizou e o próprio
confronto deu lugar a algum grau de
entendimento. Mas nem por isso,
guardadas as proporções de cada caso
e a conjuntura histórica de nossos
dias, podemos dizer que haja um regime democrático na Rússia, ou que a
democracia americana não venha
sendo arranhada, a ponto de correr
graves riscos.
É só lembrar, de um lado, que, se Putin logrou alcançar algum grau de estabilidade em seu país, reforçou ao
mesmo tempo os componentes autoritários de uma democracia de fachada. É só lembrar, de outro lado, a ascensão do neoconservadorismo e do
fundamentalismo nos Estados Unidos, sob as bênçãos do presidente
Bush.
Boris Fausto escreve às segundas-feiras nesta
coluna.
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