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CARLOS HEITOR CONY
Uma entrevista
RIO DE JANEIRO - Sem desdenhá-lo, confesso que nunca dei
muita bola para Michael Jackson
enquanto vivo, nem estou dando
depois que morreu. Mesmo assim,
esta é a segunda crônica que escrevo sobre ele, sinal que de alguma
forma ele -como pessoa e não como artista- me impressionou.
Pela primeira vez, vi no último
domingo uma entrevista do cantor
com um jornalista, do qual não
guardei nome e figura, que foi uma
aula de como se deve abordar polemicamente um personagem polêmico. Perguntou tudo o que devia
perguntar, mas de forma serena,
entrou feio e forte em assuntos
delicados, como a propalada pedofilia do artista. Não o irritou nem
o provocou.
Apenas uma vez intrometeu-se
pessoalmente na conversa. Michael
confirmou que levava amiguinhos
de seus filhos para dormir com ele,
na mesma cama. O entrevistador
entrou na história com um comentário espontâneo, mas letal: "Eu
não gostaria que meu filho fosse para a sua cama".
Os manuais de jornalismo condenam os comentários pessoais durante as entrevistas e reportagens
de caráter geral, privilegiando a objetividade e a isenção. Mesmo assim, Michael saiu-se bem, dizendo
que o entrevistador dava à palavra
"cama" uma conotação de sexo -o
que na realidade é comum, ir para
cama com alguém equivale potencialmente a um ato sexual.
Nada disso -disse o artista. "Deito com as crianças, ouvimos música, leio histórias para elas, comemos biscoitos." O jornalista passou
para outro assunto, não mais se introduziu na entrevista, deixando o
entrevistado falar o que quis, respeitando o que ele dizia.
Conheci um repórter que entrevistava um cara perguntando se ele
era corno, o cara dizia "eu não", mas
ele insistia: "Não adianta negar, eu
sei que o senhor é corno!".
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