São Paulo, terça-feira, 07 de julho de 2009

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MARCOS NOBRE

Obama lavou as mãos

ENQUANTO o governo de George W. Bush ignorava a América Latina, o Brasil brincou de líder regional. Depois da tentativa de golpe contra Hugo Chávez, em dezembro de 2002, o governo brasileiro organizou o "grupo de amigos da Venezuela".
Com o governo Bush já nos seus estertores, o Brasil teve papel protagonista no caso da crise boliviana de setembro de 2008, quando foi convocada reunião de emergência da Unasul, entidade regional que ninguém mais lembra o que significa ou para que serve.
Com razão, o governo brasileiro hoje condena veementemente o golpe em Honduras. Mas, no momento, essa condenação não colabora de fato para a superação de um impasse que pode bem acabar em tragédia. Não se vê nenhuma iniciativa brasileira para criar um "grupo de amigos de Honduras" ou algo similar. Não se vê o Brasil buscando uma solução negociada para o conflito. E a razão é simples: o Brasil não se mexe porque acredita que os EUA retomaram seu lugar de líder inconteste das Américas.
Pode até ser que isso seja verdade no atacado. Mas não no caso de Honduras. O governo Obama pode dizer que resolveu tomar uma posição prudente e que buscou reforçar o papel institucional da OEA (Organização dos Estados Americanos), mas o fato é que resolveu fingir-se de morto. Tem lá suas razões para isso. Não por uma qualquer importância estratégica insuspeita do país centro-americano na geopolítica mundial.
Mas porque o caso de Honduras pode produzir o primeiro grande precedente de intervenção política externa da era Obama. Entrando diretamente no conflito, os EUA poderão ser acusados de abusarem de seu poderio militar e econômico contra um pequeno país bananeiro. Se mantêm sua posição dúbia, podem ser considerados oportunistas que não defendem de fato a democracia.
De maneiras diferentes, os governos de Bill Clinton e de George W. Bush foram extensões canhestras da Guerra Fria. O primeiro inventou a guerra humanitária. O segundo, a guerra preventiva. Obama veio para enterrar esses esqueletos e negociar uma nova "pax" americana. Mas o roteiro está sendo escrito à medida que o filme vai sendo rodado. E Honduras não estava no script. Só que o impasse está instalado e não vai se dissolver no ar. A estratégia protelatória e risível de "ultimatos" da OEA já se esgotou. O confronto é iminente. E o governo Obama simplesmente lavou as mãos.
É justamente nesse momento de inação do governo norte-americano que o Brasil deveria aparecer e dizer a que veio. Brincar de líder regional quando o dono do pedaço tira férias é fácil.

nobre.a2@uol.com.br

MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta coluna.



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