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Festa dos nanicos
Nova legislação eleitoral aumenta restrições aos debates e ao noticiário no rádio e na TV e beneficia candidaturas de aluguel
ENGANA-SE quem imaginar
que a disputa pela Presidência dos EUA, no ano
passado, deu-se apenas
entre o candidato democrata,
Barack Obama, e o republicano,
John McCain. Agremiações das
mais diversas, como o Partido da
Lei Seca, o Partido da Constituição, o Partido Libertário e o Partido Socialista dos Trabalhadores participaram do pleito.
Dificilmente atrairia apoio a
ideia de que tais candidaturas
devessem ter direito ao mesmo
destaque obtido por Obama e
McCain no rádio e na televisão.
Seria na prática impossível atender a tal exigência -uma vez que,
em qualquer democracia vigorosa, a tendência vai no sentido de
se produzirem tantos partidos e
candidatos quanto o desejar a
imaginação humana.
Bem diversa, como se sabe, é a
cultura política brasileira. A cada
eleição, criam-se novas leis e regulamentações tratando de impor ao livre debate entre os candidatos uma lógica puramente
cartorial e paternalista. Uma isonomia postiça se cria entre os
chamados candidatos nanicos e
os que possuem real representatividade no eleitorado.
Foi um notável progresso, dentro desse quadro cronicamente
restritivo, o veto do presidente
Lula a algumas determinações
da minirreforma eleitoral aprovada no Congresso, que visavam
a restringir a realização de debates na internet. Prevaleceu a
convicção de que a rede, por não
ser concessão do Estado, não pode ser enquadrada no regulamento do rádio e da TV -que
ademais atuam numa banda eletromagnética restrita.
O avanço nesse enfoque veio
acompanhado, entretanto, de
um grave retrocesso no que diz
respeito à mídia eletrônica tradicional. A legislação já vinha limitando de forma excessiva a cobertura das campanhas eleitorais: determinava-se que o noticiário de rádio e TV concedesse
igual tempo para todos os candidatos, mesmo os nanicos, nos
três meses anteriores ao pleito.
Com a minirreforma, a regra
terá de ser obedecida em qualquer ocasião, em qualquer período. A tutela ultrapassa, assim,
qualquer limite.
Nada há de incorreto na preocupação de assegurar um mínimo de igualdade de condições
entre candidatos a um cargo eletivo. Apesar de suas muitas distorções, a existência de um horário eleitoral gratuito no rádio e
na TV não deixa de ser um mecanismo útil nesse sentido.
Mas a proteção paternalista a
candidatos inexpressivos serve
apenas para dificultar o acesso
dos cidadãos às informações e às
ideias que realmente o interessam em cada disputa eleitoral. A
discussão política degenera num
espetáculo constrangedor e paradoxal: uma formalidade caótica se instaura no lugar de um
embate claro entre propostas alternativas de governo.
Legendas e candidaturas de
aluguel surgem, assim, das próprias facilidades concedidas por
uma legislação cartorial. A distorção se estende, agora, além
dos três meses oficiais de campanha política: é a festa dos nanicos, em prejuízo do eleitor.
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