|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TENDÊNCIAS/DEBATES
A gestão Lula segue a política econômica de FHC?
NÃO
Crescimento econômico e inclusão social
LUIZ GUILHERME PIVA
O principal objetivo da política
econômica do governo Lula é a retomada sustentada do crescimento,
com distribuição de renda. Em lugar da
gestão econômica voltada para si mesma do governo anterior -refém das armadilhas monetária, fiscal e cambial
montadas ao longo dos dois mandatos,
nos quais o desenvolvimento e a inclusão social não estiveram na pauta econômica-, a centralidade agora é a dimensão social: geração de emprego e
renda, justiça distributiva e políticas sociais amplas e eficientes, de forma a integrar à condição de cidadãos dignos
milhões de brasileiros hoje excluídos
dos mercados de produção, renda e
consumo e da participação nas esferas
públicas de decisão.
Essa mudança requer reformas estruturais, que estão sendo debatidas, formatadas e encaminhadas. Mas requer
também responsabilidade na gestão
econômica, tal como está sendo feito.
Isso por três motivos. Primeiro, porque
é preciso consolidar a estabilidade monetária, reduzindo os atuais índices inflacionários de forma duradoura. Segundo, porque a herança do governo
anterior é perversa: inflação anual, no
atacado, de quase 30% e, no varejo, de
mais de 12%, dívida líquida de quase
60% do PIB, instabilidade cambial e retração do crédito externo ao que se soma o nervosismo político e econômico
do quadro internacional. E terceiro,
porque o equilíbrio macroeconômico é
condição à instauração do círculo virtuoso de crescimento e inclusão social
para cujo advento o governo foi eleito.
Mudança e consistência econômica
não são incompatíveis. Antes, alimentam-se mutuamente: assim como a estabilidade propicia bases para o crescimento, este gera recursos e mecanismos
que consolidam aquela. Na área fiscal,
por exemplo, é necessário prosseguir no
esforço de ajuste ora em curso, de forma
a gerar superávits primários capazes de
inaugurar uma trajetória declinante da
relação entre dívida e PIB. Mas é preciso, conjugadamente, aperfeiçoar a arrecadação tributária, combater a sonegação e aprimorar a qualidade tanto do
gasto quanto da receita pública.
O governo já iniciou o debate da reforma tributária com o objetivo de aprimorar os tributos sobre a produção e de
estimular o aumento da produtividade
e da competitividade, assim como de
melhorar a distribuição de renda e reduzir as desigualdades regionais, com
fortalecimento do pacto federativo. Do
lado das despesas, almeja-se a melhoria
do gasto público com a integração das
diversas políticas, da sua focalização
nos segmentos pobres e da avaliação de
seu retorno social. Além de ganho social, haverá economia de recursos para
o reforço da própria atividade social do
governo, hoje comprimida por restrições orçamentárias.
De igual importância e urgência é a reforma previdenciária, que, além dos aspectos de justiça social e de sustentação
intertemporal do sistema, tem grande
impacto fiscal. Ela almeja amplificar a
geração de poupança e de recursos capazes de mobilizar investimentos. Seja
diretamente seja por fundos públicos,
mistos e privados, os recursos do sistema previdenciário podem fornecer alavancas para o mercado de capitais e para os investimentos produtivos.
Quanto aos investimentos públicos,
que têm entre seus alvos a criação de bases para a ampliação dos investimentos
diretos privados, internos e externos, é
possível melhorar o uso dos recursos
orçamentários e daqueles alocados em
fundos como os regionais, os setoriais,
os de poupança compulsória dos trabalhadores e outros, com ação ativa dos
bancos oficiais de crédito e de fomento.
O setor financeiro privado também
deve ter aprimorado seu papel no estímulo à produção e ao crescimento. Há a
necessidade de diminuir os riscos contratuais de maneira a reduzir os spreads
bancários, elevando a oferta de crédito.
Uma série de reformas vem sendo desenhada para modernizar as relações negociais e as instituições e normas que regem os mercados. A meta é obter maior
segurança jurídica dos contratos -o
aperfeiçoamento do mercado de seguros, do financiamento imobiliário, do
mercado de capitais e da lei de falências
são pontos importantes dessa pauta.
Voltadas à ampliação e à dinamização
do crédito, as cooperativas de crédito
são alvo imediato da atuação do governo. Já estão em funcionamento grupos
de trabalho que estão elaborando medidas de disseminação e de fortalecimento do sistema. Além de impulsionar o
crescimento, as cooperativas propiciam
a parcelas da população hoje distantes
dos serviços bancários e do crédito acesso a recursos de baixo custo para seus
empreendimentos por meio de mecanismos como equalização de juros, fundos de aval, seguros de crédito e parcerias com instituições financeiras.
A austeridade da gestão econômica
nesse primeiro momento é mostra de
que o governo sabe quais são seus objetivos e os requisitos e mudanças necessários para alcançá-los. Diferentemente
das ações meramente reativas do governo anterior. A política monetária, por
exemplo, hoje se guia para a combinação favorável entre metas de inflação e
espaço para o crescimento, não como
resposta encurralada à fragilidade externa. Não é difícil perceber isso, e os
atores e analistas já entenderam que a
segurança e a ousadia são os pilares da
confiança com que o governo Lula está
mudando o Brasil.
Luiz Guilherme Piva, 40, economista e cientista
político, é assessor econômico do Ministério da
Fazenda.
Texto Anterior: Frases
Próximo Texto: A gestão Lula segue a política econômica de FHC? - Sim - Domério Nassar de Oliveira: O Sol ainda gira ao redor da Terra Índice
|