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Tempo de repensar
ANDRÉ LARA RESENDE
Era de se esperar que a combinação
da abertura comercial com a valorização do câmbio implicasse uma significativa redução do superávit comercial. Assistimos, entretanto, a uma deterioração muito mais rápida do que
se poderia imaginar.
A rápida reversão das contas de comércio exterior foi inicialmente associada ao forte surto de demanda que
se seguiu à estabilização.
O estancamento da inflação crônica
proporciona à população, em especial
à de baixa renda, um significativo aumento de poder aquisitivo. Some-se a
volta do crédito ao consumidor, um
aumento generalizado de confiança, e
o resultado é conhecido: um surto de
demanda que transborda num expressivo aumento das importações.
A experiência mostra que é preciso
reagir com rigor a essa inevitável explosão de demanda, sob risco de comprometer o esforço de estabilização. A
forma correta de fazê-lo é por meio de
um profundo ajuste fiscal. Contida a
excessiva pressão dos gastos públicos,
abre-se espaço para o crescimento da
demanda privada.
Mas não há, infelizmente, milagres.
O ajuste das contas públicas é sempre
um longo e penoso processo. E ficamos muito aquém do esperado. O jeito foi promover um rigoroso aperto
da política monetária. O surto de demanda foi revertido -não sem custos, é preciso reconhecer-, mas a deterioração do balanço comercial não
foi estancada. Enquanto as importações continuam a crescer, as exportações estão praticamente estagnadas.
Após um período de rápido crescimento, associado ao efeito de liberação de uma demanda reprimida, esperava-se que as importações viessem a
convergir para um novo patamar.
Não há, entretanto, até agora, sinal
dessa convergência. Ao contrário, o
coeficiente de penetração continua a
crescer. Supondo um crescimento
econômico apenas razoável e valores
plausíveis para as contas de serviços e
transferências, a projeção das contas
externas nos leva a déficits em conta
corrente perto de 5% do PIB para os
próximos anos.
Desastre iminente? Claro que não,
mas essa situação só é sustentável na
hipótese de financiamento externo
abundante e da rápida recuperação do
crescimento das exportações. Essa parece ser a aposta implícita na atual política de gradual redução dos juros internos e de minidesvalorizações aproximadamente equivalentes à inflação
doméstica.
A abundância de financiamento externo não é algo com que se deva contar. Todo financiamento só é abundante enquanto não é imprescindível.
Mais preocupante, contudo, são as
implicações para a política comercial.
No lugar de um programa coerente,
pautado pela meta da unificação de
tarifas e a integração regional, que
cria condições estáveis e previsíveis, a
política de comércio exterior corre o
risco de ser definida por um intervencionismo casual e um protecionismo
sem rumo.
O efeito perverso sobre os investimentos, as distorções e as ineficiências na alocação de recursos irão, sem
dúvida, comprometer a capacidade de
recuperação das exportações.
Na tentativa de estimulá-las, os programas de promoção e subsídios implicarão custos fiscais crescentes. Não
existem respostas fáceis, mas não é
preciso ir longe para concluir que é
tempo de repensar.
André Lara Resende escreve às terças-feiras nesta coluna.
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