São Paulo, terça-feira, 08 de junho de 2004

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LENTA E FALHA

"A Justiça tarda, mas não falha", assegura a velha máxima jurídica. O Brasil, contudo, insiste em desafiar esse axioma, pois, por aqui, a Justiça tarda e falha. A rigor, pode-se até mesmo dizer que ela falha porque tarda, isto é, que muitos de seus defeitos podem ser atribuídos justamente à morosidade com que se resolvem as disputas.
Como mostrou reportagem desta Folha, uma condenação em primeira instância por homicídio leva em média 1.431 dias no Estado de São Paulo. Esse é o tempo gasto entre o inquérito e o início do cumprimento da pena, sem considerar toda a plêiade de recursos cabíveis. Segundo resultados de uma pesquisa realizada pelo Seade (Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados) com mais de 7,2 milhões de processos em São Paulo, no caso de estelionato, a demora é de 1.139 dias; furto, 1.036; roubo, 766; tráfico de drogas, 743.
É claro que uma Justiça rápida não é um fim em si mesmo. A celeridade excessiva traz riscos como o do cerceamento do amplo direito de defesa e o de julgar casos notórios de acordo com os ventos do clamor popular -normalmente um mau conselheiro. Mas a exagerada lentidão do Judiciário verificada hoje produz perigos ainda maiores.
O juiz existe essencialmente para julgar, para decidir, para "suum cuique tribuere" (atribuir a cada um a sua parte), na fórmula celebrizada pelo jurista romano Ulpiano. Ora, uma Justiça que leva anos para pronunciar-se até sobre assuntos menos importantes falha em seu propósito mais básico. Não surpreende, portanto, que o Judiciário esteja vendo seu crédito abalado como instância de resolução de problemas.
Trata-se de uma descrença especialmente daninha, porque ela se espalha para o próprio Estado. Um país que não confia em sua Justiça está fadado a tornar-se um país que não funciona. Daí a importância de aprovar uma reforma do Judiciário que o agilize e possa recolocá-lo como pilar de uma sociedade harmônica, capaz de resolver pacificamente suas disputas e controvérsias.


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