São Paulo, Terça-feira, 09 de Fevereiro de 1999
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

A maldição do Planalto

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - O general João Figueiredo deixou o poder pedindo para ser esquecido. Foi, piedosamente. José Sarney saiu do Planalto com 80% de ruim/péssimo nas pesquisas. Fernando Collor caiu antes do tempo sob o estigma, mais que justo, de falta de decoro, além de impopularidade similar à de seu antecessor.
Fernando Henrique Cardoso, a julgar pela mais recente pesquisa do Datafolha, embicou na trilha de todos os seus antecessores mais recentes, excluído Itamar Franco, talvez o único presidente na história que, em vez de fazer o sucessor, foi feito por ele, conforme piadinha que se atribui ao embaixador dos EUA Melvyn Levitsky.
Cada um deles tem biografias diferentes, origens políticas e ideológicas diferentes, seguiram políticas com algumas diferenças, pelo menos em determinados momentos (a moratória de Sarney, o confisco de Collor, as privatizações em grande escala de FHC).
O que poderiam, então, ter em comum que os arraste para o abismo (se é que FHC vai de fato cair nele, o que ainda está por ver)?
Todos estiveram cercados pela mesma classe dirigente, se o leitor me perdoa o jargão. Gente que está com o governo, seja qual for o governo, desde as sesmarias.
Gente que não enriquece o governo com propostas, idéias ou com críticas que permitam correções de rumo em tempo. Apenas agarram-se como sanguessugas ao corpo do governo, o qual, aliás, abandonam correndo quando o sangue já se exauriu (não foi assim com Sarney e com Collor?).
Quem governa de fato é a tecnoburocracia, não sujeita à "accountability" indispensável (quem responde pelos US$ 40 bilhões desperdiçados na defesa do indefensável?).
Como sociólogo, FHC deveria ser o primeiro a saber de tudo isso. Corre o risco de deixar o governo pedindo não apenas que esqueçam o que escreveu, mas que se esqueçam dele próprio. Como Figueiredo.


Texto Anterior: Editorial: AS LIÇÕES DE UM REI
Próximo Texto: Brasília - Eliane Cantanhêde: Como o diabo gosta
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.