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A cada qual, a sua culpa
CLÓVIS ROSSI
São Paulo - Para que não digam que
estou criticando quem já não tem poder, vou reproduzir o que disse de
Gustavo Franco em texto publicado
dia 31/10/97, quando ele ainda era todo-poderoso:
"Gustavo Franco pertence a uma estirpe de acadêmicos (a que aderiram
alguns jornalistas, mais recentemente) que passa a sensação de que, se lhe
perguntarem o que acontecerá no dia
30 de março de 2004, vai responder,
sem piscar, a que horas o Sol nascerá,
qual será a cotação do marco alemão
em relação ao baht tailandês, quem
ganhará as eleições para a Câmara
Municipal de Antofagasta (Chile) ou
a cor dos olhos de todos os bebês que
estiverem nascendo na Tanzânia naquele momento".
Quem se der ao trabalho de ler as 26
páginas do discurso de despedida de
Gustavo Franco notará que ele perdeu
o cargo, mas não perdeu as suas inamovíveis certezas. Continua se achando a única pessoa que sabe das coisas
(de todas as coisas) e que, por extensão, fez apenas o que era certo.
A julgar pelo texto, o mundo inteiro
uniu-se numa conspiração formidável
para derrubá-lo do cargo e para jogar
o real na lona.
Mas seria fácil demais atribuir unicamente ao ex-presidente do BC a culpa pelo desastre. Em meio a um punhado de alucinações, pelo menos
uma de suas frases corresponde de fato à realidade. A saber:
"A política cambial nunca foi minha, mas uma política de governo".
Ou, em outras palavras, o presidente
da República, Fernando Henrique
Cardoso, é o principal responsável pela sobrevalorização do real. Por extensão, é também o principal responsável
por tudo o que vier a ocorrer como
consequência da correção de rumos
imposta pela realidade.
No Brasil, infelizmente, há uma tendência, antiga aliás, de buscar bodes
expiatórios na figura de subalternos
para poupar o chefe. FHC, assim como
ficou com os bônus da âncora cambial, enquanto durou, deve assumir o
ônus do naufrágio, até quando durar.
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