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ELIANE CANTANHÊDE
Que coisa, hein?
BRASÍLIA - Não fica bem e não é politicamente correto o governo do PT
falar simultaneamente em taxar inativos e em beneficiar devedores patronais da Previdência.
Com uma das mãos, argumenta
com o déficit e a "injustiça social" para mudar o sistema de Previdência
dos servidores públicos e até arranhar direitos adquiridos. Até com algum sentido, é verdade.
Com a outra, diz que é pragmático,
precisa aprovar o Refis (programa de
renegociação de débitos federais) e
desobstruir a pauta de votação do
Congresso. Por isso, inclui no projeto
essa coisa inexplicável de suspender
processo criminal contra patrão que
recolheu contribuição previdenciária
do seu empregado, mas não depositou no INSS. Isso é apropriação indébita. E apropriação indébita é crime.
Esse acordo é ruim em qualquer hipótese e fica pior ainda quando o governo é do PT, a presidência da Câmara é do PT e os líderes governistas
são todos de esquerda. Pragmatismo
em política é necessário. Mas, como
tudo na vida, tem limite.
O episódio todo mostra que os grupos de interesse (ou lobbies) que sempre se movimentaram no Congresso e
arredores continuam desinibidos e
ganhando paradas importantes. O
partido no poder mudou, mas o poder parece não mudar nunca.
Além disso, a decisão de alterar o
projeto do Refis para livrar a cara dos
devedores da Previdência ocorre no
mesmo momento em que o Senado livra a cara de Antonio Carlos Magalhães no caso dos grampos da Bahia.
Juntas, as duas coisas, de um lado, irritam a opinião pública e, de outro,
excitam os aproveitadores habituais.
Ajudam a desmanchar o mito de
que, com o PT dando as cartas, tudo
seria diferente no jogo. E criam brechas para pressões indecentes.
Num dia pode recolher dinheiro
alheio, não depositar no INSS e ficar
impune. No outro, vai poder também
não pagar diferentes débitos públicos
e ficar por isso mesmo. Até que tudo
fique possível. E o Brasil mantenha
justamente a fama de país onde tudo
pode. O país do jeitinho. Ou o país da
impunidade.
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