São Paulo, segunda-feira, 09 de julho de 2001

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BORIS FAUSTO

Política paulista

Até que ponto a política paulista tem, historicamente e nos dias que correm, características diversas das de outros Estados da Federação?
O tema, quando mais não fosse, serve para recordar que o feriado de hoje em São Paulo não serve apenas para economizar energia e para fugir da poluição que envenena os outrora belos dias do inverno paulistano. Como talvez pouca gente lembre, 9 de julho de 1932 marca o início da "guerra paulista" contra o governo provisório de Getúlio Vargas.
Ao propor a adoção no país de um regime político corporativo, em substituição à democracia representativa, Oliveira Viana -brilhante sociólogo e contumaz autoritário- temperava a proposta com certo ceticismo, tendo em vista a inarticulação do país. Ressalvava, porém, o caso de São Paulo, dada a maturidade de suas "classes econômicas".
Curiosamente, décadas depois, com propósitos opostos, o sociólogo -Simon Schwartzman- , no livro "Bases do Autoritarismo Brasileiro" (1982), publicado antes com o título de "São Paulo e o Estado Nacional", localizou uma tradição liberal e maiores possibilidades de afirmação democrática, em função do espetacular crescimento econômico e da formação de classes sociais com contornos definidos.
Teria sentido falar de uma especificidade política paulista, nas últimas décadas, reforçando as linhas traçadas pelos sociólogos citados e outros mais? Sem estabelecer uma escala comparativa de superioridade com outras unidades da Federação e sem ignorar as muitas mazelas políticas de São Paulo, que saltam aos olhos, a resposta afirmativa faz sentido.
Em meio aos percalços, às linhas tortas marcadas pela corrupção, um cenário de maior consistência ideológica vem se firmando no Estado, aproximando-o, sob esse aspecto, do Rio Grande do Sul, guardadas as diferenças. O arco político paulista consolidou-se em uma tendência de direita, com um conteúdo populista e autoritário, em uma de centro, com inclinações à esquerda, e em uma tendência de esquerda com vários matizes, desde os mais radicais até os que se aproximam do centro.
O quadro político paulista é um bom exemplo da validade das noções de direita e de esquerda. Seus conteúdos mudaram com relação ao passado, mas nem por isso deixaram de existir, como a direita, significativamente, insiste em negar. Não é preciso muito esforço para demonstrar o que estou afirmando. Basta lembrar o conteúdo das disputas eleitorais para a Prefeitura de São Paulo e para o governo do Estado nos últimos anos e o quadro que se desenha para as eleições do ano que vem.
São Paulo não é, entretanto, um caso à parte na realidade política nacional. Seus traços específicos fazem parte de um país integrado, mas com visíveis marcas regionais. Seja como for, uma guerra de um Estado contra o governo central, como ocorreu em 1932, não caberia aparentemente na cabeça de ninguém. Só aparentemente, porque, afinal de contas, um governador vizinho dos paulistas desenvolveu essa fantasia para mal de seu Estado e do país.


Boris Fausto escreve às segundas-feiras nesta coluna.



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