São Paulo, sábado, 09 de julho de 2011

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Editoriais

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Apatia global

Expectativa positiva do início do ano quanto à recuperação da economia mundial cede lugar ao desalento diante de dados setoriais preocupantes

A ansiada recuperação da economia global caminha sobre terreno pantanoso. Basta a divulgação de dados setoriais decepcionantes, como as cifras de emprego nos EUA ontem, para fazer os mercados mundiais deslizarem.
Nos países desenvolvidos, os problemas principais são o baixo crescimento e o peso da dívida pública deixada pela crise financeira. Há uma relação perniciosa entre eles: a falta de dinamismo agrava o endividamento, o que impõe mais austeridade aos governos, num círculo vicioso.
Os recorrentes pacotes de auxilio a Grécia, Irlanda e Portugal, em ambiente cada vez mais recessivo, mostram a dificuldade de lidar com dívidas impagáveis. O rebaixamento da nota de risco dos títulos da dívida de Portugal pela agência Moody's, para a categoria "investimento especulativo", só reforça o temor de que será difícil escapar de uma reestruturação da dívida (ou calote parcial).
No momento, autoridades tentam delinear a participação do setor privado, que rolaria as dívidas voluntariamente, sem caracterizar calote formal. Com isso, busca-se ganhar tempo para que cortes fiscais e arrochos salariais deem frutos, o que ainda soa duvidoso.
Nos Estados Unidos o problema é similar, embora mitigado pelo fato de o país controlar a principal moeda de reserva global. Com a emissão de dólares, os EUA conseguem financiar-se a custo baixo, mas sem alterar a implacável aritmética da dívida. Para o Fundo Monetário Internacional, será preciso um corte de gastos de 7,5% do PIB americano, nos próximos anos, para conter a deterioração.
Tal ajuste seria facilitado num ambiente de maior crescimento, mas, assim como na Europa, as notícias são desanimadoras. A criação de empregos continua frustrante: em junho, apenas 18 mil vagas; o desemprego voltou a subir, para 9,2%. Três anos após a crise, os EUA mal conseguem sustentar 2% ao ano de crescimento.
A primeira oportunidade para um ajuste seria a negociação no Congresso para elevar o limite de endividamento do governo (US$ 14,3 trilhões), atingido em maio, mas os partidos não se põem de acordo. Republicanos defendem cortes drásticos de gastos, inclusive nos programas de saúde, e não aceitam aumentos de impostos. Já democratas querem mínimos ajustes nos programas e elevação de impostos para os mais ricos.
O ponto crucial é que o legado da crise financeira implicará carestia por anos a fio no mundo desenvolvido, num contexto de envelhecimento da população e concorrência cada vez maior dos países emergentes. As consequências para a economia mundial ainda são incertas, mas podem incluir menor crescimento estrutural e maior protecionismo.
Nesse cenário, até o desempenho mais robusto de economias como China, Índia e Brasil seria afetado. Um dos efeitos previsíveis é o arrefecimento da alta nos preços de commodities, como minérios e alimentos, que tanto tem contribuído para manter a saúde das contas externas por aqui, em que pese a valorização do real.


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