São Paulo, segunda-feira, 09 de agosto de 2004

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CARLOS HEITOR CONY

Transparência demais

RIO DE JANEIRO - Nunca houve um presidente da República que aparecesse mais na TV do que o atual. Com os canais oficiais de que dispõe, mais os periféricos (Senado, Câmara, Justiça etc.), a simpática figura presidencial aparece todos os dias, o que seria natural em casos de protocolo. Também em longos e soporíferos seminários disso e daquilo, colóquios e simpósios.
Enfrenta um sério problema em cada uma dessas aparições diárias: ou lê o que escreveram para ele ou fala de coração aberto, improvisando sobre qualquer assunto, tendo como gancho qualquer pretexto de circunstância.
No primeiro caso, torna-se chato, e além disso qualquer urubu que ameaça as pistas dos nossos aeroportos percebe que o presidente não entende muito bem do que está falando.
No segundo caso, ele atinge o seu tom habitual, é pitoresco, transmite sinceridade, bons sentimentos, só cola mal é o tom oposicionista, conceitual, em que dá exemplos e faz promessas como se ainda fosse o candidato de eleições perdidas.
Há coerência nos quadros em que pinta os problemas nacionais. São praticamente os mesmos de sua primeira candidatura presidencial. Acontece que ele agora é o presidente, caminha para o fim de seu segundo ano de mandato, e continua aparecendo, aparecendo, falando, falando.
Aparece mais do que aquela vaca (ou boi) que desfila de um lado de lá para cá no canal Rural. E fala mais do que aquele pastor que fica horas prometendo o reino de Deus a seu auditório, e de quebra, livrando seus ouvintes das ciladas do Demônio.
Transparência assim é demais, tanto a da vaca, a do pastor e a do presidente. Abro exceção para os momentos em que ele aparece chorando ou mexendo no torno mecânico em que trabalhava, como metalúrgico, no início de sua vida profissional. São momentos que comovem e mostram o bom homem que sempre foi e esperamos que continuará a ser.


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