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Operação Dominó
Prisões na cúpula do Estado de Rondônia são evidência de penetração talvez sem precedentes do crime no poder público
HÁ DUAS maneiras de
analisar o saldo da
Operação Dominó, da
Polícia Federal, que
resultou na prisão de integrantes
das cúpulas de Legislativo, Judiciário e Executivo de Rondônia
suspeitos de participar de um esquema de desvio de recursos da
Assembléia Legislativa.
Sob uma perspectiva otimista,
o Brasil vem fazendo progressos
no combate à corrupção. Duas
décadas atrás, seria impensável
uma situação em que altos dignitários de um Estado fossem investigados e encarcerados. E não
porque as autoridades de então
não se metessem em esquemas
de desvio de dinheiro público.
O episódio, porém, comporta
hermenêuticas menos favoráveis. O grau de infiltração do crime organizado nos Poderes de
Estado parece sem precedentes.
Tal impressão é compatível com
a evolução das quadrilhas, que se
sofisticaram e diversificaram
seus campos de atuação.
No caso específico de Rondônia, a dimensão da metástase é
dada pelo número e pela qualidade dos envolvidos. Dos três chefes de Poderes, apenas o governador, Ivo Cassol (PPS), não foi
preso -ele é investigado pela PF
em outros escândalos. Mas seu
ex-titular da Casa Civil e candidato a vice na chapa pela reeleição, Carlos Magno Ramos, é um
dos detidos. Pior, 23 dos 24 deputados estaduais estariam metidos no esquema de assalto organizado aos cofres públicos. Os
eventuais substitutos dos líderes
encarcerados também se encontram entre os suspeitos.
E Rondônia não é, infelizmente, um caso isolado. A máfia dos
sanguessugas atuava em nível federal. Ela não chega a comprometer 96% da legislatura, como
em Rondônia, mas 90 deputados
federais em 503 (18%) é uma cifra também assustadora, considerando-se que a vigilância da
sociedade sobre a Câmara é bem
mais intensa do que aquela sobre
as Assembléias estaduais.
As interpretações otimista e
pessimista da Operação Dominó
não se excluem. O crime organizado parece de fato ter deitado
raízes pelas mais diversas estruturas de Estado, de prefeituras
de cidades pequenas que recebem ambulâncias superfaturadas mediante propina, até parcelas significativas de Legislativos
estaduais e federal, passando por
magistrados de elevadas cortes.
Apesar -ou talvez seja melhor
dizer "em virtude"- do envolvimento cada vez maior de autoridades em escândalos de corrupção, algumas instituições, notadamente a Polícia Federal e o
Ministério Público, seja em âmbito nacional, seja nos Estados,
estão agindo com maior eficiência e independência.
Ainda que num ritmo inferior
ao desejável, intocáveis de ontem hoje são objeto de investigação e até podem ser detidos. Espera-se que, amanhã, possam ser
julgados, eventualmente condenados e, mais importante, que
cumpram a pena imposta nos
termos da lei. Acabar com a impunidade de "colarinho branco"
é a receita mais eficaz que se conhece para reduzir a corrupção e
reverter o processo de infestação
do poder público por organizações criminosas.
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