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OTAVIO FRIAS FILHO
Califórnia dream
A eleição do ator Arnold
Schwarzenegger para o governo
da Califórnia pode ser debitada às extravagâncias eleitorais do maior Estado norte-americano. Ali se combinam
o coração da indústria do entretenimento, de onde provém o novo governador, e o culto a uma política alternativa, heterodoxa, que usa e abusa de
plebiscitos.
Não se pode dizer que sua vitória,
apesar de surpreendente, traduza
uma novidade. Ela confirma outra vez
que a política se tornou uma forma de
espetáculo regido pela linguagem publicitária da mídia. O precedente mais
óbvio, no caso, é o de Ronald Reagan,
também ator, também governador da
Califórnia (1966-1974).
Mas as semelhanças ficam aí. Desde
o fim dos anos 40, Reagan militava como dirigente do sindicato dos atores.
Candidatou-se quando fazia quase 20
anos que o público não estava acostumado a vê-lo nas telas. Presidente, colheu a vitória na Guerra Fria e foi um
dos artífices da ideologia econômica
liberal que prevalece desde então.
Schwarzenegger é um oportunista
que tem uma noção vaga dos problemas da administração. Fez a campanha prometendo menos impostos e
mais gastos sociais -para usar os termos de seus filmes, seria como poupar
munição e descarregá-la no inimigo
ao mesmo tempo. E explorou o tema
ambiental num Estado onde existe
uma obsessão ecológica.
Sua conversão de mito do cinema
em político profissional foi muito
mais fulminante e postiça do que a de
Reagan. Nem por isso, agora que ela se
consumou, deveria ser vista como
mero acidente eleitoral ou simples resultado da obstinação com que
Schwarzenegger persegue fama, dinheiro e poder desde que chegou aos
EUA, em 1968.
O inglês não era a língua dos pais da
maioria dos californianos, dos quais
25% são estrangeiros. A eleição do herói de filmes classe B significa a vitória
do imigrante que venceu como poucos na saga percorrida por tantos de
seus eleitores. Schwarzenegger representa bem a ideologia do imigrante
adaptado, que se torna mais realista
que o rei.
Sua imagem está perfeitamente sintonizada com o clima belicoso em que
os atentados e a política de Bush jogaram os americanos. Está em sintonia
também com a idéia infantil, verdadeira "mensagem" de seus filmes, de
que os grandes esquemas da corrupção, da injustiça, do "mal", enfim, só
podem ser exterminados por um justiceiro.
Além da crise no setor da internet, a
Califórnia é vítima de uma demagogia
antiimpostos, inaugurada por Reagan, que vem depauperando a capacidade do Estado para investir e é uma
das causas da crise energética que se
somou à outra. A solução encontrada
pelo eleitorado é de um escapismo à
altura de sua fábrica de sonhos.
Otavio Frias Filho escreve às quintas-feiras nesta coluna.
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