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O VOTO AFEGÃO
Pela primeira vez na história,
a população afegã deverá escolher hoje seu líder através de um processo eleitoral direto. Seria tentador,
afirmar que a democracia finalmente
chegou ao país centro-asiático, mas
isso não corresponderia aos fatos.
Em boa medida, o pleito de hoje
pode ser interpretado como uma
ofensiva de marketing do presidente
George W. Bush, que deverá passar
ele mesmo pelo teste das urnas dentro de três semanas. E é bom para a
campanha do candidato republicano
dizer que ele "implantou" a democracia no Afeganistão, país em que
interveio em 2001 após os atentados
do 11 de Setembro.
Não há dúvida de que a situação no
país é melhor do que a vivida sob o
regime anterior, a teocracia repressora dos Talebans, e também do que
a do Iraque, que foi igualmente palco
de uma invasão norte-americana. A
comparação, contudo, não basta para promover o caos de média intensidade que reina no país numa democracia. Nem os candidatos nem os
funcionários da ONU encarregados
de conduzir o pleito têm acesso a extensas áreas do país. Na Província da
Paktia, cidadãos se registram inúmeras vezes para votar. Até crianças foram inscritas. O total de registros
chegou a 170% das estimativas.
Nas três Províncias do sudeste do
país, um conselho de 500 líderes tribais determinou no mês passado
que todos os eleitores devem votar
em Hamid Karzai, o presidente interino. Em outras regiões, dominadas
por senhores da guerra que se mantêm graças aos lucros do tráfico de
ópio, a situação não é melhor.
A intervenção no Afeganistão está
melhorando as condições de vida da
população, mas, em vez de investir
energias e recursos numa encenação
democrática, teria sido melhor acelerar os esforços de reconstrução e de
avanço institucional. Seria preferível
que o pleito não se submetesse à
agenda de Bush, mas se realizasse
quando o país apresentasse condições reais de eleger também um Parlamento. Karzai, que quase certamente será eleito hoje, seguirá governando por decreto.
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