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CARLOS HEITOR CONY
A moça e a viagem
RIO DE JANEIRO - Não faz tanto tempo assim. A moça me telefonou, convidou-me para almoçar numa cantina do Leme, disse que o assunto era
urgente e importante. Como morava
perto, fui ao almoço e me surpreendi:
a moça existia mesmo, estava bem
vestida e era muito, muito bonita.
Deixou bem claro que quem pagaria o almoço seria ela. E entrou no assunto: puxou de uma pasta os originais de um livro. Antes, tranqüilizou-me; não eram poemas, nem contos,
nem romance. Era uma espécie de
diário entre duas datas: 14 de agosto
de 1997 e 21 de maio de 1999. Durante
quase dois anos, ela viajara num disco voador.
É evidente que, antes da viagem,
ela fizera contatos, fora pesquisada e
testada de diferentes formas, finalmente aceita para a viagem, que, na
realidade, foi mais do que uma viagem, mas uma temporada num planeta ou coisa que o valha, fora do Sistema Solar.
Dentro do Sistema Solar, ela me informou, a Terra é o único planeta habitado, pois somente aqui existem
condições de vida orgânica. Mas o Sol
é uma estrela insignificante, insignificantes são os seus planetas. Pela
imensidão do espaço, há sóis maiores
e melhores, e muitos planetas mantêm, em relação a seu núcleo de energia (luz e calor), a mesma distância
proporcional da Terra em relação ao
Sol.
Bem, ela me disse muitas outras
coisas e perguntou se eu queria dar
uma olhada no diário. Perguntei por
que me havia escolhido para tal e tamanha honra. Modestamente, ela
disse que tivera uma intuição. Agradeci penhorado, mas recusei. Para
não parecer mal-educado, expliquei
meus motivos.
Tomando conhecimento de sua
viagem, de duas, uma: ou negaria ou
acreditaria na sua aventura. Na primeira hipótese, seria indelicado para
com ela. Na segunda, teria de tomar
uma porção de providências para me
ajustar à revelação recebida.
O mais prático seria afastar de mim
aquele cálice. Para compensar, fiz
questão de pagar o almoço.
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