São Paulo, quarta-feira, 10 de janeiro de 2001

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FERNANDO CANZIAN

Fratura exposta

SÃO PAULO - É de impressionar a capacidade deste governo de achar uma saída para seus problemas e de enrolar uma solução para as dificuldades alheias. Um exemplo foi a rápida tramitação no Congresso do projeto de lei que determina a quebra do sigilo bancário pela Receita.
A lei deve ser sancionada hoje pelo presidente. Visa cruzar dados bancários e fiscais para pegar o que o jargão da Receita chama de ""fratura exposta" de sonegadores.
É um projeto louvável. Quem não deve não teme. E, de quebra, haverá ganho de arrecadação. No Congresso, chutaram a cifra de R$ 9 bilhões.
Não tão rápida tem sido a solução para o aperto no orçamento da maioria dos brasileiros. Já vai para mais de um mês que o Congresso, estimulado pelo governo, ""esqueceu" de tocar outro projeto de lei, o que atualiza a tabela do IR.
Sem ele, quem ganha mais de R$ 900 paga 15% de Imposto de Renda. Se o projeto fosse aprovado, os 15% passariam a ser cobrados somente de quem recebe acima de R$ 1.155.
O governo é contra a correção. Diz que o ""fim da inflação" tornou-a desnecessária. É tão contra que não corrige a tabela do IR desde 96. De lá para cá, a inflação oficial foi de 35% e é óbvio que os salários tiveram aumentos no período. Assim, milhares de pessoas que estavam isentas de pagar impostos vêm caindo, ano a ano, nas garras do Leão. Basta passar a ganhar mais de R$ 900.
Além de cínico no argumento, o governo está sendo extremamente injusto nesse caso. Pois é exatamente quem ganha menos que paga mais impostos indiretos via consumo de bens e serviços no país.
Estudo recente do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) mostra que os brasileiros que ganham pouco mais de R$ 900 (e que já recolhem os 15% de IR) pagam outros 14% em impostos como ICMS, PIS e IPI. Proporcionalmente, é quase o dobro do que pagam cidadãos remunerados acima de R$ 4.500.
Para corrigir a distorção, só uma reforma tributária. Do jeito que a arrecadação vai, recorde sobre recorde, não há razão para consertar nada.



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