São Paulo, Segunda-feira, 10 de Maio de 1999
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Brasil, o paraíso da abulia

FERNANDO RODRIGUES

Brasília - O que mais chama a atenção no governo FHC não são os escândalos. É a falta de reação a eles.
Não é necessário pensar no que aconteceria se alguns fatos recentes tivessem ocorrido na Suécia ou nos Estados Unidos. Basta o leitor imaginar a repercussão que teriam os seguintes desmandos nos governos Sarney ou Itamar, aqui mesmo no Brasil:
1) caso Clóvis Carvalho - um ministro vai passear em Fernando de Noronha, leva a família e agregados, usa um avião da FAB. Depois de alguma pressão, esse ministro paga um valor completamente incompatível com o que lhe seria cobrado no mercado. Em seguida, descobre-se que esse ministro e outros já foram outras vezes veranear em Fernando de Noronha. Ninguém paga. O governo se cala;
2) caso Lampreia - um ministro vive 34 meses sem pagar aluguel de sua casa ao governo. Depois de ser cobrado, concorda em pagar um valor irrisório pela mordomia. Tudo parcelado em 24 meses, sem juros nem correção.
O ministro se cala. O governo, idem. Não há reação;
3) dossiê Caribe - aparecem suspeitas sobre uma conta secreta do presidente no exterior. Ninguém tem obrigação de provar que uma denúncia contra si é falsa, mas bastaria ir ao banco e pedir uma declaração de que ali não tem nem nunca teve conta.
Mas o presidente e sua Polícia Federal enrolam meses. Decidem processar algumas pessoas sem provas. E quebrar o sigilo telefônico de um jornal, ferindo um direito constitucional;
5) compra de votos - a Constituição é emendada com votos comprados a R$ 200 mil a cabeça para permitir a reeleição de FHC. O dinheiro vai para os deputados dentro de um saquinho.
Ninguém fala nada. Dois deputados renunciam. Só;
6) desvalorização - bancos lucram R$ 10,1 bilhões com a desvalorização da moeda. O governo se cala. Uma CPI é criada. Daí o governo fala: foram só R$ 5,2 bilhões de lucros.
E ninguém diz nada. Não há reação.
FHC aperfeiçoou a alienação do Brasil a um nível nunca imaginado. A abulia nacional é sua grande obra.
Parabéns, FHC.


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