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Retrocesso florestal
Relatório de Aldo Rebelo alia atraso ruralista a nacionalismo antiquado para desmontar legislação
que protege as florestas
O relatório do deputado Aldo
Rebelo (PC do B-SP) à comissão
especial da Câmara, com propostas para o novo Código Florestal,
extingue a pouca luz da discussão
e deixa em cinzas as pontes que
ruralistas e ambientalistas mais
esclarecidos vinham tentando
construir entre os dois lados.
O código, que existe desde 1965,
foi modificado em 2001 por medida provisória. O texto estipula que
donos de terras estão obrigados a
manter intactas parcelas de reserva legal -de 20% a 80% da propriedade, a depender da região.
Proprietários particulares, assim, dividem com o poder público
o ônus de preservar as matas como bens comuns. Além da reserva, a legislação em vigor prevê
áreas de proteção permanente
(APPs). Sem exploração agrícola e
cobertos de vegetação, topos de
morro e margens de corpos d'água
impedem erosão e assoreamento
de nascentes, rios e represas -no
interesse de todos.
Até o final do século 20, latifundiários e ruralistas limitavam-se a
desrespeitar o código, certos da
impunidade. A partir de 2008, o
governo federal passou a atuar
com mais rigor, no esforço de conter o desmatamento na Amazônia.
Tornou-se necessário reconhecer em cartório (averbar) o passivo
ambiental. Vale dizer, delimitar e
registrar as áreas desmatadas em
desacordo com a legislação. Na
falta de averbação até dezembro
daquele ano, o dono ficaria sujeito
a multas diárias de R$ 50 a R$ 500
por hectare.
A ameaça de fiscalização pôs os
ruralistas em polvorosa. Passaram a denunciar o código de 1965
como uma peça que inviabilizaria
a agropecuária nacional. Conseguiram arrancar do governo Lula
sucessivos adiamentos do prazo
para início das multas, de 2008
para 2009 e depois para 2012.
Todos os que tenham cumprido
a lei descobrem-se agora como tolos. Encorajados pelo vaivém do
Planalto, ruralistas infratores e
seus cúmplices parlamentares se
lançaram numa campanha para
derrubar o código.
O nacionalismo antiquado do
PC do B só veio tornar mais "aloprada" essa visão discrepante de
tudo o que se descobriu e aprendeu sobre economias sustentáveis
nas últimas décadas. Houve recentemente reduções no desmatamento da Amazônia, como quer a
opinião pública nacional e internacional. Mas, para Rebelo, isso
equivale a dobrar-se diante de potências imperialistas.
A proposta alinhavada pelo relator prodigaliza moratórias, suspende multas, alarga prazos para
recomposição de reserva legal, reduz APPs, libera exploração de
várzeas e topos de morro... Um lobista em defesa dos interesses
mais atrasados da agropecuária
não teria feito melhor do que o
parlamentar comunista.
Ao tentar transformar em regra
de direito o fato consumado dos
crimes ambientais, o relator abandona a busca de equilíbrio entre
agenda econômica e natureza.
Não por acaso, acata a reivindicação de delegar aos Estados o poder de legislar sobre reserva legal
e APPs -que mal disfarça a intenção de transferir as leis para instâncias mais vulneráveis à influência corruptora.
Se faltar ao Congresso coragem
para enterrar de pronto esse projeto, que ao menos adie a decisão
para a próxima legislatura.
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