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ANTONIO DELFIM NETTO
De FHC a HK
Os políticos são volúveis por
definição. Em 1995, o presidente
Fernando Henrique dizia que "administrar o Brasil é fácil". Hoje, diz que
"dificuldades sempre existem, mas já
somos capitães de longo curso em
matéria de dificuldades". E prossegue:
"Ah, se tudo desse certo, talvez até não
tivesse graça!". Com natural acanhamento acrescenta: "Se tudo desse certo, não precisaria de políticos, menos
ainda de estadistas..." As afirmações
são contraditórias, mas não fazem mal
a ninguém. O que pensar, entretanto,
de técnicos que, ignorando a sua situação política, dizem, como fez Horst
Köhler, diretor-gerente do Fundo
Monetário Internacional, que, "em situações extremas, em que as Bolsas
continuem a perder valor, seria um
pesadelo que um país emergente como o Brasil ou a Turquia viesse a dar
um calote na dívida". E o que fazer
com ele quando acrescenta que tudo
vai bem porque "a probabilidade de
tal pesadelo se transformar em realidade é de apenas 20%"?
Menos modesto que o presidente
Fernando Henrique, ele confessa que
"Brasil e Turquia são um grande desafio, porque os seus maiores problemas
são de natureza política. É difícil para
o FMI entendê-los, porque o nosso foco é a economia!". O que se deve perguntar é qual é o significado da afirmação de que o Brasil e a Turquia têm
uma probabilidade de 20% de dar o
calote? De que extraordinário modelo
saiu essa pervertida estimativa de probabilidade? Qual a razão desse ridículo formalismo quantitativo? Como
pode ele fundamentar tal "crença"?
Essa probabilidade existe ou é apenas
uma emanação da sua mente? Que ligação tem ela com o mundo real?
De onde vem, afinal, tal preocupação com o calote? Ficamos sabendo,
na entrevista que ele concedeu ao "Financial Times", que o FMI está muito
preocupado com uma rápida desvalorização do dólar, o que poderia produzir uma fuga de capitais dos EUA e desestabilizar todas as economias do
planeta. Uma das consequências desse fato seria a desaparição do crédito
para as economias emergentes, em
particular para o Brasil e para a Turquia, que, assim, iriam à glória...
O fato curioso é que Horst Köhler
jura sobre a Bíblia que as duas economias "vão bem" e têm sido administradas magistralmente, mas podem
sofrer as consequências de um movimento desordenado do dólar americano. Somos quase levados a acreditar
que, se os EUA não tivessem uma política econômica tão ruim, o que permitiu a sobrevalorização do dólar, o
mundo estaria a salvo. Brasil e Turquia estão sob a ameaça de uma probabilidade de 20% de decretar o calote
devido à irresponsabilidade do Tesouro americano!
O fantástico na declaração do diretor-gerente é que ele, em princípio, é
contra a intervenção no mercado de
câmbio, mas, "se o dólar se desvalorizar rapidamente, não intervir não seria a resposta correta". Todos sabem
que, mais dia, menos dia, a taxa de
câmbio dos EUA será submetida a um
processo de ajuste, porque os portfólios dos investidores têm um limite
para absorver os dólares americanos,
o que determina o limite de financiamento de seus déficits em conta corrente. Parece que a hora está chegando, e não há nada que o FMI possa fazer...
Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras
nesta coluna.
dep.delfimnetto@camara.gov.br
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