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MELCHIADES FILHO
A Receita desandou
BRASÍLIA - São gravíssimas, mas
não surpreendentes, a acusação da
ex-secretária da Receita de que o
Planalto lhe pediu que acelerasse a
conclusão de auditoria determinada pela Justiça nos negócios da família Sarney e a apuração, feita pela
Folha, de que a recusa dela em se
curvar à pressão política acabou
contribuindo para sua demissão.
Não surpreendem porque as coisas estavam mesmo mal contadas.
O governo não havia produzido explicação plausível para a dispensa
de Lina Vieira. Em 11 meses, ela não
teve senão uma atuação discreta e
corajosa, rebatendo tentativas de
anistiar maus contribuintes e ordenando aperto inédito a grandes empresas e sonegadores, aquilo para o
que havia sido nomeada.
Não surpreendem, também, porque o governo Lula coleciona episódios em que as fronteiras das instituições e os limites republicanos foram desconsiderados em razão de
interesses mais imediatos.
Parte disso se deve ao entendimento de que o Estado precisa ser
protagonista, não se omitir nas
grandes questões, se defender e se
impor, tanto no campo político como no gerencial. Nada é trivial na
administração pública, gosta de dizer, com razão, Dilma Rousseff.
Parte disso, porém, se deve à aplicação distorcida dessa ideia.
A tratorada na Anac, o arranjo
dos arquivos da Casa Civil, a normatização da Polícia Federal, tudo
seria justificável não fossem os bastidores mais tarde desvendados: o
favorecimento ao compadre de Lula em negócios do setor aéreo, o
bombardeio de rivais com dossiês, o
engavetamento de investigações
que se aproximavam do Planalto.
Lula deixará legados positivos,
mas não no campo institucional, no
aperfeiçoamento de um Estado
transparente e eficiente. Há o belo
cadastro do Ministério de Desenvolvimento Social. Mais o quê?
Segundo a moral do lulismo, o Estado só é protagonista se Lula ou
seu grupo estiverem no poder.
melchiades.filho@grupofolha.com.br
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