São Paulo, domingo, 10 de novembro de 2002

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A AGENDA JÁ EXISTE

Foi sintomático que, na primeira reunião do chamado "pacto social" patrocinada pelo futuro governo petista, faltou o principal: a agenda. Pior foi a sensação de que o "pacto", vendido como inovação pelos petistas, parece ignorar que a agenda das reformas no país já está dada há muito tempo; que, para as principais delas, já houve "consensos mínimos"; e que a batalha para ir além desses consensos mínimos e produzir as reformas propriamente ditas se dará no Congresso Nacional.
No caso da reforma tributária, o relator da emenda na Câmara, deputado Mussa Demes (PFL-PI), passou anos a fio a viabilizar o seu projeto. Em 1999 chegou-se a um acordo sobre o tema no Legislativo, que girava em torno da criação de um tributo nacional sobre valor agregado, transferindo carga tributária da produção para o consumo -princípio defendido por todas as chapas que recentemente disputaram a Presidência. Mas o Executivo, à época, dinamitou a proposta de Demes temendo perder arrecadação.
Sobre a reforma previdenciária, também muito já se avançou no Congresso. Um projeto promissor de autoria do então deputado federal petista Eduardo Jorge (hoje secretário de Saúde de Marta Suplicy), que cria um sistema universal para os novos ingressantes no sistema, foi menosprezado pelo governo e massacrado pelo próprio PT, então empenhado em fazer uma oposição raivosa à gestão de FHC.
Também se chegou muito próximo de um consenso sobre a reforma trabalhista no final da gestão de Itamar Franco. Houve uma convergência abrangendo as entidades mais representativas dos trabalhadores e do patronato, os formuladores da política pública, estudiosos e parlamentares da direita à esquerda no sentido de implantar o chamado contrato coletivo de trabalho, acabar com a unicidade e o imposto sindical e substituir a CLT por um código de trabalho afinado com os tempos modernos. Não foi à frente sob FHC porque o antagonismo radical entre tucanos e petistas abortou o processo.
Seria, portanto, um lamentável desperdício desprezar o quanto já se caminhou na definição dos consensos mínimos rumo à pauta reformista de que o país tanto necessita. O momento é de destravar essas discussões no Congresso Nacional, de estabelecer prazos para as deliberações e de o Executivo dedicar-se diuturnamente a convencer deputados e senadores de que o Brasil não pode mais furtar-se às reformas.
Se o chamado "pacto social" transformar-se numa ferramenta adicional para convencer o Parlamento de que é chegada a hora de resolver as pendências sobre as reformas, tanto melhor. Mas o tal "pacto" não tem condições institucionais nem políticas de substituir o Legislativo e o Executivo na tarefa de, para além de consensos mínimos e dentro da normalidade jurídica, estabelecer quais setores ganharão e quais perderão, bem como quais serão as compensações para estes últimos.



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