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TENDÊNCIAS/DEBATES
As armadilhas do terror
ALBERTO SILVA FRANCO, RENATO CAMPOS PINTO DE VITTO e RENATO SÉRGIO DE LIMA
Se vencer o discurso do terror, estaremos aceitando jogar o jogo dos criminosos, no qual o Estado de Direito já entra em desvantagem
O ANO de 2006 encerrou-se sob
o signo do medo e instaurou
uma nova fase no debate sobre
o crime e a violência no Brasil, que envolve enfrentar ataques de criminosos contra profissionais de segurança
pública, meios de transporte e, mesmo, contra a população.
Como reação a tais fatos, o ano de
2007 começa com dois movimentos.
O primeiro é positivo e merece ser
incentivado. Trata-se da intenção declarada pelo presidente da República
e por alguns governadores de buscar a
implementação de ações conjuntas e
coordenadas na área, independentemente da luta político-partidária.
O segundo é preocupante, pois, na
medida em que o modo como se dará
o enfrentamento será central no impacto esperado na luta contra a violência, o debate inaugurado a partir
dos episódios verificados no Rio de
Janeiro está centrado, em demasia,
na categorização de tais ações enquanto atos de "terrorismo" ou não.
O risco embutido nessa lógica reside em reforçar um modelo que valoriza a segurança do Estado em detrimento da segurança da sociedade.
Por conseguinte, as medidas que tendem a ganhar destaque são aquelas de
natureza meramente dissuasória, típicas dos jogos de guerra. Porém, não
há uma reflexão mais acurada sobre a
eficiência e a efetividade de tais ações.
Um exemplo são os investimentos
em inteligência, que confundem,
muitas vezes, inteligência policial
com inteligência de Estado. Pela primeira deveríamos entender o fortalecimento de mecanismos de prevenção de crimes e/ou de subsídios ao esclarecimento de casos. A informação
assume papel estratégico no desenho
de políticas públicas e, por meio dela,
as instituições e os governantes podem ser responsabilizados e ter suas
ações avaliadas.
A questão é que o Brasil clama, há
muito tempo, por uma política de segurança pública que, exatamente ao
contrário da visão do terror, aja sem a
lógica do pânico, busque integrar esforços de modernização da gestão das
polícias e das demais instituições públicas envolvidas -sejam elas estaduais, municipais ou federais- e contemple a prevenção e o uso de informações como elemento estruturador
da ação estatal.
Nossas polícias têm uma importante missão constitucional, recaindo sobre tais instituições enorme responsabilidade pelas condições de vida da
população. Seu papel, no entanto, não
exaure o conteúdo de uma verdadeira
política de segurança, a qual depende
da ação de inúmeras outras instituições públicas.
Os três Poderes da República não
podem deixar de dar respostas ao vilipêndio do Estado de Direito: respeito
irrestrito às garantias constitucionais, ampliação e aprimoramento do
acesso à Justiça e das políticas sociais,
assistência jurídica de qualidade, revisão das normas processuais penais,
incentivo à prevenção da violência, ao
combate à criminalidade organizada
e à impunidade e ao fomento às instituições públicas tecnicamente eficientes e transparentes, respeito e valorização de profissionais qualificados etc.
A superação de práticas burocráticas terá muito mais impacto do que
reformas legislativas extemporâneas
que, mais uma vez, diante do pânico,
apostam que o direito penal é a solução para os principais problemas da
segurança pública. Essa é uma falsa
premissa e que reproduz a tendência
de uma produção legislativa por espasmos motivados por atos pontuais.
Mais do que endurecer penas, a revolução na prevenção e no enfrentamento da violência passa pela criação
e desobstrução dos canais de intercâmbio de informações entre os vários atores envolvidos, aqui incluídos
os municípios e as instituições da área
econômica do governo, num movimento de atribuir responsabilidades,
monitorar processos e criar mecanismos que envolvam Estado e sociedade num contínuo projeto nacional de
justiça e desenvolvimento social.
Se a opção pelo discurso do terror
for a vencedora, estaremos aceitando
jogar o jogo dos criminosos, no qual o
Estado de Direito já entra em campo
em desvantagem e na defensiva. Isso
porque o terror paralisa, pede respostas imediatas e abre brechas para que
a violência seja a linguagem que articula as ações.
ALBERTO SILVA FRANCO, 75, desembargador de Justiça
aposentado, é presidente do IBCCrim (Instituto Brasileiro
de Ciências Criminais). RENATO CAMPOS PINTO DE VITTO, 32, é primeiro subdefensor público-geral do Estado de São Paulo e coordenador da Comissão Especial de Justiça e Segurança Pública do IBCCrim. RENATO SÉRGIO DE LIMA, 36, doutor em sociologia, é
coordenador-chefe do Departamento de Comunicação do
IBCCrim.
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