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CLÓVIS ROSSI
Caubóis enlouquecidos
WASHINGTON - Mais de uma TV norte-americana mostrava, anteontem à noite, imagens da estátua gigante de Saddam Hussein vindo
abaixo, acopladas ou seguidas de
imagens da queda do Muro de Berlim e da derrubada da suástica do topo do Reichstag, em Berlim, ao final
da Segunda Guerra Mundial.
Causa choque e pavor verificar que
a única superpotência do planeta
equipara o passeio militar contra um
tiranete de subúrbio e um Exército
mulambento, de capacetes furados, e
sem Força Aérea, com as epopéias
que foram as vitórias na guerra
"quente" de 1939/45 e na Guerra Fria
que se seguiu.
A mídia norte-americana inventou
uma Guarda Republicana portentosa e ferozes fedayins com a ajuda dos
indefectíveis analistas.
O governo norte-americano, de seu
lado, inventou um "perigo para o
mundo" e armas de destruição em
massa de posse do Iraque.
Dá até para entender: a cultura à
John Wayne exige que o adversário
do "mocinho" não seja um qualquer.
No mínimo, precisa ser um Billy the
Kid.
Bem feitas as contas, verifica-se que
o maior perigo para o mundo é os Estados Unidos, com um governo espantosamente pequeno para um país
incrivelmente poderoso, se autoconcederem o direito de matar indiscriminadamente porque se sentiram
vulneráveis depois do 11 de setembro
ou porque o seu presidente cisma
com outro governante qualquer.
É claro que os festejos de iraquianos
em cima da estátua de seu tirano caído podem anestesiar os americanos e
muita gente ao redor do mundo. Mas
o sempre sóbrio e realista jornal britânico "Financial Times" fazia questão de lembrar, anteontem mesmo,
que havia, sim, iraquianos festejando, mas havia também iraquianos
chorando seus mortos, cuidando seus
feridos e lamentando suas propriedades destruídas.
Bush poderia ver faroestes mais
modernos, que mostram que a realidade é mais complexa do que o mundo em branco ou preto dos tempos de
John Wayne.
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